sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

"O livro da Consciência"

"Todo o tecido da mente consciente é criado a partir dos mesmos fios: imagens criadas pela capacidade de mapeamento do cérebro" .
  António Damásio in "O Livro da Consciência"


António Damásio consegue em poucas páginas, dado a profundidade do tema, expor uma hipótese cientifica, testável e acessível, sobre o que forma a consciência. E porque existe uma consciência.

De facto, o livro tem uma longa introdução sob a perspectiva da evolução do que significa  possuir uma consciência. Resumidamente, plausivelmente argumenta como a consciência pode ter evoluído de comportamentos mais simples, e como de facto ainda hoje essas estruturas são os alicerces do nosso Eu. A vantagem para os seres possuidores de consciência será a capacidade de tomar melhores decisões.  

Daqui passa para o desmontar do processo consciente, sempre justificando as suas afirmações em conhecimentos concretos de neurologia, e constroi gradualmente a sua tese. O suporte neuroanatómico e neurofisiológico para tudo o que diz é de facto o ponto forte deste livro.




 SPOILERS

 O livro apresenta a consciência dividida em 3 componentes principais. A vigília, a mente e o eu. É a "Santíssima Trindade" da consciência. Segundo ele, o mais simples componente e o primeira a ser cientificamente abordado (talvez por essa razão) foi a vigília. O segundo é a mente. A mente é o processamento matemático de informação, informação essa que pode circular a nível consciente ou não. O terceiro é o Eu. E o livro explica como o Eu ao ser acrescentado nesta mistura forma a consciência. 

Eu penso que aqui o autor dá um verdadeiro passo em frente. Outro ponto forte da obra: É apresentar uma explicação plausível, de como esse fluxo principal da mente pode ser também o pensamento consciente. Um pensamento em que nós sabemos que somos nós que o pensamos. 

Para isso ele divide o Eu em outras 3 fases. É a escalada de complexidade nessas fases que forma o Eu que depois chega à mente (Self comes to mind, no original)  para formar a consciência no estado de vígilia.

E são: O proto-Eu, o Eu nuclear e o Eu-autobiográfico.

O proto-Eu é o mapa das disposições corporais. Mapeia o corpo, as emoções, e processa os sentimentos primordiais dessas emoções.

O Eu nuclear é o resultado da interacção do proto-eu com objectos. Qualquer coisa exterior ao cérebro que  resulte num outro objecto (que é uma representação interna) e que interaja e se integre nos mapas do proto-eu. Ambos objecto mental e proto-eu sofrem alterações no decorrer dessas interações, formando um padrão coerente.

O Eu-autobiográfico é a relação dessa interacção objecto/proto-eu registada no cenário maior da experiência vivida ou até antecipada.

Damásio rejeita ainda formalmente a noção de espaço de trabalho global avançada por Baars, Dehaene e Changeaux. Propõe antes a divisão de tarefas entre um espaço imagetico e um espaço disposicional, e prevê a base neuronal de tais processos. Como Dennet, insiste que não há um sitio que forme a consciência. Ela é um processo global embora fortemente suportado por determinadas estruturas. O tronco cerebral, o tálamo e o córtex.

END SPOILERS

O cuidado da tradução e da escrita é notório, mas por uma razão qualquer não me parece ao nível dos anteriores. O conteúdo sim, é de primeira categoria. Tenho no entanto a certeza que mesmo os apreciadores de boa fraseologia irão ficar satisfeitos mais que não seja pelas pequenas pérolas salpicadas pelo livro fora.

De facto, não me impressionou tanto este livro como o "sentimento de Si", talvez por muitas ideias virem já dessa altura, mas a actualização e polimento dos conceitos desta nova obra é razão suficiente para uma leitura. Quem não tem lido nada de nada sobre a consciência, então até posso dizer que o invejo. Tem pela frente uma excelente montanha russa de revelações sobre a mente, o cérebro e a consciência.


Está como disse escrito de um modo ainda acessível, mas num nível de dificuldade acima da média dentro dos padrões da divulgação cientifica. Penso que esta obra representa mesmo uma unificação original dos pensamentos do autor, destinada a vários meios diferentes simultâneamente.

Embora o autor admita que a consciência continue um mistério (1) , muita coisa na consciência já não o é. Temos uma ideia muito boa de como ela se forma e de porque a temos.

Aconselho fortemente a todos os seres conscientes.

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(1) O que é um mistério? Se as hipoteses aqui espostas forem provadas ficam ainda coisas por explicar, por exemplo porque sentimos como sentimos - o problema dos qualia. Mas deixará de ser um mistério.  Se o termo mistério significa algo como "não fazemos sequer uma ideia por onde lhe pegar", então acho que já não é mistério há algum tempo - pelo menos desde o "Consciousness Explained" de Daniel Dennet.

quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

Conhecer o que não é mensurável. Um ensaio.

O Arnaldo Vasconcelos, autor do excelente blogue “Análise da Ciência”, defende que a ciência precisa de aceder a informação do mundo físico para especular sobre ele. E eu estou de acordo.

Considero mesmo que essa obsessão cientifica com a recolha de dados é a diferença prática entre a filosofia e a ciência. 

Mas depois diz que se existirem entidades que não tenham efeitos mensuráveis, direta ou indirectamente que mesmo que possam ser alvo de conhecimento por qualquer outro sistema cognitivo, a ciência não será esse sistema. Ele diz assim:

“Bem a minha noção teórica da ciência, exposta neste blog, deixa bem claro que não é do escopo da ciência analisar a existencia de um ser que é fenomenicamente inexistente, mas que ela deve-se calar (meio que “wittgensteinianamente”) a respeito deste assunto (visto que não é seu objetivo e nem tem meios para isso).
Agora repassar que para todos os meios “cognitivos” é impossível é uma derivação deveras exagerada.”(1)

E é exagerada. De facto parece-me que se pudermos conhecer uma entidade que seja igual a não existir para todos os efeitos, é com a participação da ciência. E parece-me que apenas com esta. E que tal é possivel.

Sempre me manifestei contra “mortes anunciadas” do conhecimento científico. Em cada altura defendi isso de acordo com o contexto da previsão. Por isso em vez de passar a pente fino os argumentos anteriores vamos à questão em causa:

Imaginemos uma teoria A que descreve a ocorrência de uma entidade x tal que essa entidade’ é capaz de produzir entidades a1, a2 e a3 quando em contacto com a entidade y. 

Imaginemos que as entidades a1 e a2, previstas pela teoria são encontradas com as características esperadas. No entanto a entidade a3, por questões teóricas não é passível de ser detectada por nenhum método. A razão porque tal coisa acontece é porque não causa neste universo nenhum efeito. E tal como previsto pela teoria, ela não é detectada, por mais tentativas que se façam. 

O que eu proponho, é que a consistência e falseabilidade da teoria A seja a prova científica de que a entidade a3 existe, embora não tenha propriedades físicas e seja a causa de qualquer efeito mensurável. Até que ponto uma entidade sem propriedades físicas existe realmente é algo que deixo para o futuro, mas se houver tal coisa, esta será provavelmente a única maneira de saber se ela existe.

Essa maneira é, resumidademente, se a sua existência for prevista a partir de algo que já tenhamos bem estabelecido. Enquanto houver uma seta do tempo em que os efeitos não precedem as causas, esta entidade b3 tem todos os requisitos para ser uma entidade intangível e incomunicável, passível de ser aferida como real pela ciência.

Existem analogias possíveis com entidades científicas já previstas? Não totalmente, mas sim para as linhas gerais, no sentido em que sugere que tal possas vir a acontecer.

Algumas interpretações de teorias levam a coisas como um numero de universos alternativos infinitos e infestáveis, a teoria das cordas prevê a existência de dimensões que talvez não possamos medir, (embora as cordas em si não possam ser medidas podemos medir efeitos da sua existência).

(1)http://arnaldo.networkcore.eti.br/1923-o-dragao-de-minha-garagem-e-o-conhecimento-de-contato.html/comment-page-1#comment-368

sábado, 22 de janeiro de 2011

Eleições

Amanhã vamos a votos para um novo presidente.

Saber em quem votar não é um conhecimento cientifico. Porque na realidade não é conhecimento de todo.


Demasiadas coisas que não se sabem, demasiadas que pensamos saber e não são verdadeiras, e muitas que poderemos não saber nunca.

Sobre os candidatos, sobre as suas politicas e sobre o que está reservado para nós.

A ciência não tem resposta para tudo. Mas de um modo geral, as respostas que temos, as coisas que sabemos mesmo (aquelas que podemos justificar com segurança), são as cientificas.

Mas é preciso tomar decisões na mesma e avançar. Por isso é usar a informação que se tem o melhor que se pode e  decidir.

sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

O problema da indução de Hume.

A indução.

Para Hume a falta de racionalidade na aquisição de conhecimento era algo demonstrável e grave.

Ele dizia que, por oposição à dedução, em que se retiram conclusões de permissas iniciais, algo completamete lógico, a indução não tinha nada de racional.

A indução é a generalização da informação pela persistencia dos dados. Por exemplo:

Eu vejo um cisne e é branco,
vejo outro e também é branco,
quando continuo por aí fora até ao 9000º cisne e eram todos brancos se concluo que os cisnes são todos brancos estou a tirar uma conclusão por indução.

Mas nada me garante que não possa aparecer um cisne preto. E por conseguinte a generalização era apressada. (de facto os viajantes europeus encontraram cisnes pretos na Australia, quando se pensava que eram todos brancos).

Quantos objectos tenho de analizar até fazer uma generalização justificada? Para Hume, infinitos. Segundo ele, nunca há nada que nos garanta que as coisas vão continuar a ser como sempre foram. Para lá da plausibilidade, porque Hume adianta que o que nos dá a segurança de dizer que o que aprendemos por indução funciona é também indução. E que isso torna  a génese do conhecimento um circulo vicioso sustentado nele próprio. No qual não podemos confiar racionalmente.

O universo pode deixar de ser como é a qualquer momento. Defacto não temos maneira de provar definitivamente isso. Mas não é plausivel que vá acontecer nos próximos 5 minutos.

Naturalmente que há razões para acreditar que Hume não acreditava realmente nesta conversa, pois continuou a fazer uma série de coisas tal e qual como faria se elas se continuassem a comportar como sempre comportaram. Continoou a usar facas com cuidado, a não saltar de cabeça para o chão duro, e a evitar regar a mão com alcool e passar sobre a vela.

O falsificacionismo.

Uma resolução racional deste problema veio de Popper com o já aqui descrito falsificacionismo. Popper dizia que para lá de explicar todos os dados existentes, uma teoria tem também de prever acontecimentos futuros. E acontecimentos que possam ser testados com vista a validar a hipotese.

Embora isto talvez não resolva por completo o problema de Hume, permite eliminar com sucesso uma série de falsos positivos e à partida eliminar afirmações que digam pouco sobre o objecto em estudo. Sugere ainda que testes devam ser feitos que sustentem a teoria (são aqueles que poêm o nucleo das suas ideias em causa, ja que se admirmos que qualquer teste poê a teoria em causa não estariamos sempre em condições de avaliar as anomalias ou fazer acertos à teoria).

O critério da falsificabilidade é largamente aceite como sendo importante na caracterização da cientificidade de uma teoria.

A hipótese nula.

Mas eu creio que convem compreender que o sarilho que Hume arranjou pode não ter resposta completa. Será sempre uma resposta que se valoriza por oposição à hipotese derivada da afirmação de Hume (de que as coisas vão mudar sem aviso). Se é um facto que nada nos garante totalmente que as coisas continuam a ser como sempre foram, pode existir um contexto tal em que aceitar como mais provavel que as coisas vão deixar de ser como sempre foram, sem razão, é no mínimo ridiculo. E isso esta implicito na afirmação de que não podemos confiar que tudo se mantenha como é.

Esse contexto a que me refiro é um contexto em que nós temos muita informação não só sobre as propriedades em causa, mas também sobre a explicação de porque as coisas estão e são como são.

De facto não podemos explicar tudo até à causa ultima, mas ao explicar um facto actual com muitos outros pequenos factos subjacentes e por aí fora, trazemos para cima da mesa muitos factores que teriam de deixar de ser como são para que o produto final também deixasse de ser como é. E isso diz algo acerca da estabilidade do mundo observavel.

Penso que é correcto dizer que mesmo que não possamos ter certezas, ao termos considerado a hipotese  da inversão da indução como menos provavel então a conclusão é que então há coisas que podemos saber - por oposição a ter certezas e poder saber tudo. E eu penso que essa é a conclusão razoavel do problema de Hume. É que nunca poderemos ter certezas absolutas. Algo que defendo desde que iniciei este blogue.

Mas que se tivermos de escolher entre duas afirmações " H0 não há alteraçao" e "H1 há alteração " devemos escolher a que é apoiada por mais evidencias e teoria.

A consistencia como plausibilidade à priori.

E aqui entra outra propriedade do conhecimento cientifico em jogo. É a consistencia da informação colhida. Os factos têm de formar uma rede coerente de conhecimento, sem ser preciso colar tudo com cuspo. Isto permite racionalmente ter alguma confiança nas explicações e por conseguinte na confirmação da indução.

Voltando aos cisnes, podiamos agora dizer que são todos brancos ou pretos. Mas não é possivel aparecer um cisne verde? Não há aves verdes e não são os cisnes aves? Porque é que por indução não podemos integrar o conhecimento? Podemos e devemos.

Mas a verdade é que algures tivemos de sustentar uma afirmação dizendo "é isto e sabemos porque acontece sempre assim e temos dados que dizem que aconteceu sempre assim." Certo. O pensamento humano será sempre pensamento humano. E o mapa que a ciência quer fazer do cosmos será sempre mapa e nunca território. E segundo Godel nunca conseguiremos fechar o conhecimento de um modo que ele se sustente realmente a ele próprio.

Por isso tanto cientistas, como filósofos quando fazem afirmações sobre este mundo, antes de mais nada tentam explicar como ele é agora e porque ele é como é. Não como poderia ser se vivessemos numa coincidencia incrivel a cada segundo que passa, isso é secundário.

Acreditar que as coisas podem mudar de um momento para o outro com a mesma probabilidade com que se matém na mesma, que é a implicação do problema de Hume, é acreditar que vivemos num universo em que só tem acontecido o mais improvavel a maior parte do tempo. Porque ja passamos para a investigaçao do passado multimilenar à muito.

E se as coisas poderem ser de outra maneira?

Para lá disto, ainda estamos a tentar perceber se as coisas poderiam ser de outra maneira. Como poderia ser o universo? Será que ele se comporta como aqui em todo o lado (parece que não, que algumas constantes flutuam)?  Etc... São perguntas que a ciencia procura de facto também  responder, e que ajudariam a compreeder melhor o problema da indução.

Mas para já parece que ele não pode ser de qualquer maneira. Parece que há de facto coisas que são da mesma maneira desde os primeiros instantes da criação e que se não fossem assim o universo não seria como é. O que impede isso de mudar e levar tudo à frente? Talvez possa acontecer. Mas na escala de tempo que mede a existencia do universo isso não se alterou e não se descubriu nada que possa vir a por isso em causa. Supor que isso vai acontecer em breve é implausivel.

Pelo que podemos não estar a estudar todos os universos possiveis, mas fazemos um esforço para estudar pelo menos um. Este. E especular se haverá ou não outros.

Provar pela negativa.

Às vezes pode-se chegar ( e chega) a conclusões pela negativa. Isto é provar racionalmente que não pode haver determinada coisa ou ser de determinada maneira.

Por exemplo, eu sei que não há neste momento cisnes verdes (com um elevado grau de segurança) porque o univo planeta onde é concebivel haver cisnes é este e já não sóbra muito espaço para um bicho tão grande se esconder em numeros que permitam uma população sustentavel.

Se conseguirmos levar a hipotese contrária à exaustão a prova pela negativa resolve o problema da indução. Há quem diga que a ciencia não pode provar pela negativa. Mas quem compreender bem o que significa refutar a hipotese oposta sabe que é treta. E refutar até é mais simples que provar.

Conclusão

Certezas, não há. Mas num mundo probabilistico e se existe aproximação racional há coisas mais provaveis e mais plausiveis. O problema de Hume é um problema de falsos positivos e completude. A ciencia oferece consistência e especificidade para compensar.  A não ser que isto seja a matrix.

"Homeopatia é só água e açucar!" - Príncipe Real dia 5 Fev. às 10:23, pela nossa saúde (e carteira).

No Príncipe Real, dia 5 de Fevereiro, às 10:23, haverá uma manifestação contra a venda de agua como se fosse panaceia universal. É uma industria milionária que vive de ignorâcia ou falta de escrupulos.

O facto de ser directamente inofensivo - é só agua - não é por si uma justificação. Indirectamente vai permitir o curso normal das doenças e permitir o seu aumento de gravidade desnecessáriamente.

É uma estupidez de todo o tamanho esta feitiçaria estar legalizada e ser socialmente admitida.

Ver mais aqui:


http://1023portugal.wordpress.com/


quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

Auto-hemotreta. Quando simular um derrame é suposto curar.

Os defensores da auto-hemoterapia são poucos mas muito activos. Há então dois ou três, que parece que não fazem mais nada a não ser divulgar essa pseudo-ciência.

Hábeis utilizadores da sempre implacável "evidência anedótica" e com uma capacidade singular de apelar para autoridades desconhecidas ou dubias sem tremer, enchem páginas e páginas - como se escrever sobre o assunto fosse tão simples como fazer copy-paste.


Tentei-lhes explicar que as coisas não são verdadeiras só porque são velhas.
Que doenças que passam sozinhas não servem para avaliar eficácia com casos isolados. (Duh!!).
Expliquei que doenças crónicas tem ciclos na sintomatologia.
Expliquei porque precisamos de estudos duplamente cegos e controlados com placebo.

Tentei chamar a atençao de que aquilo causa inflamação e stress mas não tem um mecanismo plausivel para cura. E que cura é uma coisa e tratamento é outra. Mas nem uma nem outra. Nada.

Como insistiam que se fazia na Europa em animais, contei que sou veterinário na Europa. E um no activo. Choveram insinuações relacionadas com os meus conhecimentos da especialidade.

Hoje, por causa já não sei de quê, fui dar a uma página sobre hepatite. Que tinha uma copia "on-line" de um comunicado da Sociedade Brasileira de Hematologia.
Sobre a auto-hemotreta. E o que eles dizem? Dizem assim (excerto):

"PARECER CIENTÍFICO SOBRE AUTO-HEMOTERAPIA No final do mês de março de 2007, a Sociedade Brasileira de Hematologia e Hemoterapia (SBHH) \"Frente a inúmeros questionamentos recebidos, tanto por parte de profissionais médicos como não médicos, relacionados à suposta prática denominada \'auto-hemoterapia\' \", divulgou um COMUNICADO contra. A Sociedade Brasileira de Hematologia e Hemoterapia- SBHH, frente a inúmeros questionamentos recebidos, tanto por parte de profissionais médicos como não médicos, relacionados à suposta prática hemoterápica denominada \"auto-hemoterapia\", vem a público esclarecer o que se segue: A Sociedade Brasileira de Hematologia e Hemoterapia NÃO RECONHECE do ponto de vista científico o procedimento \"auto-hemoterapia\""

Para apelo à autoridade bem feito temos de apelar para as verdadeiras autoridades. Parece-me que é o caso.

Em: http://www.portaldahepatite.com/index2.php?ctg=1&nt=90

"Filosofia" de Stephen Law

Este livro de Stephen Law , ensina-nos filosofia como se de uma viagem se trata-se. Está feito como um guia turistico para uma viagem. 


Pode parecer uma estrutura bizarra para um livro com um tema tão sério mas funciona bem. Não é para saber a fundo. É para saber alguma coisa e despertar a curiosidade. E claro, entreter. Não precisa de ser lido por ordem, podemos pegar e começar a ler em qualquer parte - exactamente como num guia de viagens. E que viagem esta é.

Informação rápida, fiável e pertinente. Extremamente acessivel.

Politica, pensamento crítico, história do conhecimento, pequenas biografias, etc. Para nas paragens obrigatórias todas.

 
Aconselho.


Publicado pela Civilização, ISBN 978-989-550-720-7

terça-feira, 18 de janeiro de 2011

A cor somos nós.

"Transformar os processos em coisas é um mero artefacto da nossa necessidade de transmitir aos outros, de um modo rápido e eficaz, conceitos muito complicados."

António Damásio in "Livro da Consciencia"

O mundo de Maria (de Jackson):

Outro argumento repetido a favor do dualismo (dissociação mente/matéria (1)) é o da cientista que vive num mundo a preto e branco (2). Chamemos-lhe Maria. 

Maria trabalha num laboratório a preto e branco, de onde nunca sai. Lá investiga o ser humano e descobre tudo o que há para saber sobre o que se passa dentro do ser humano quando ele tem uma experiencia de uma cor. Qualquer cor. 

Um dia um indivíduo do exterior atira-lhe para cima uma bola vermelha e ela tem uma experiência que nunca tinha tido antes. Tem a experiencia do vermelho. Na primeira pessoa pela primeira vez. Ela aprende algo de novo, que é como é realmente ver a cor vermelha.

Diz a argumentação que se Maria já sabia tudo o que havia a saber sobre o vermelho em termos físicos então há pelo menos uma coisa que ela não sabia e logo não pode ser um facto físico.
Eu discordo que isto seja um argumento a favor do dualismo.
A cor é uma propriedade da mente. Não do objecto. A propriedade do objecto são as frequencias que reflecte.  A cor é a disposição dos padrões mentais causados pela percepção do objecto.

É precisamente por a sensação de cor corresponder a um estado mental, no mundo físico, que não é possível saber como é a cor na primeira pessoa, sem experimentar esse estado mental pessoalmente. Para estado mental estou a referir-me a um padrão de activação de neurónios. 

Maria não sabe tudo sobre o mundo físico dentro do cérebro, pois não há maneira de comunicar como é sentir a cor sem que se activem os neurónios correctos. Ela sabe quais são os que tem de activar e até pode especular como o poderia fazer com implantes de micro eléctrodos. Mas esse bocado de informação que falta não é passível de ser descrito em outra linguagem a não ser a sináptica. Ou uma que a desencadeie. Ela sabe o que se passa no cérebro de quem vê cor e sabe o que se passaria no seu. Mas o ultimo bocado de informação é mais fácil de explicar com a velha definição: “Olha, é isto”. 

E precisamente por isso sabe que só vai ver cor se replicar no seu cérebro aquele padrão. E tal não acontece apenas por ela saber o mapa do padrão neural. Tal como nós não somos pedra se soubermos tudo sobre uma pedra e tal como nos nunca seremos o território por melhor mapa que construamos.

O processo não é a coisa. A descrição estática não é o acontecimento. Experimentar a cor é o acontecimento. É o território, e a descrição é o mapa. E o mapa não é o território.

O que é que a minha defesa prevê? Que se não houver esse circuito ou complexo de circuitos que não se possa experienciar cor. Prevê que esse aparato neuronal seja igual em todas as pessoas – tem de ser inequívoco com a experiencia. E que se esse circuito for estimulado nós de facto possamos experienciar cor mesmo na ausência de um objecto colorido. 

E isto é o que a ciência sugere que se passa. O padrão neuronal é a cor. Sem ele não há cor. Pessoas com lesões na região occipito-temporal não são sequer capazes de imaginar cor (3), muito menos de a ver. Não só não vêm cor como todo o seu imaginário passou a ser a preto e branco. Perdem a memória da cor, não sendo capaz sequer de invocar esse padrão neuronal. Por outro lado, nem preciso de falar em alucinações para mostrar que a recriação do padrão neuronal com ou sem objecto leva a experimentar cor. Basta chamar a depor. A memória.

Em resumo, nós somos o corpo. Sem sermos ou termos esse padrão neural em nós não podemos “ser” a cor. Sentir a cor é isso. A cor é um padrão neuronal que existe para reconhecer determinadas frequências de luz. Não há cor sem o padrão. Podemos saber como é o padrão nos outros perfeitamente. Podemos ter o mapa. Mas para saber como é em nós, ser o território… Então temos mesmo de ser o território. O cérebro e esses padrões de circuitos sinápticos somos nós. Integrados uns nos outros e reverberando pelo encefalo e corpo.

Há muito por saber? Sim.

Argumento contra o materialismo? Nope. Isto é exactamente o que é de esperar se a cor for uma propriedade do cérebro, por assim dizer. Só damos essa propriedade ao cérebro replicando-a no cérebro. Só experimentamos a cor se… Experimentarmos a cor! A cor somos nós. Não só mas também.


(2)    Argumento do filósofo Frank Jackson. Conheci este argumento no livro do Dennet “consciousness explained” e sumarizei esta versão a partir do  guia de filosofia de Stephen Law editado pela Dorling Kindersley
(3)    “O livro da consciência” de António Damásio, pag 190 da versão portuguesa. A minha opinião é baseada no que está desenvolvido acerca de Zonas de Convergencia-Divergencia e que culmina com a apresentação de evidencia baseada na experiencia da cor!

sábado, 15 de janeiro de 2011

Overdose Homeopática

Obviamente não existe. 
(A não ser que além disso não se vá à casa de banho e se morra com ruptura de bexiga, mas é preciso juntar sempre outra coisa qualquer.)

Num produto homeopatico só existe água, para todos os efeitos.
O ano passado a campanha 10:23 juntou cerca de 400 voluntarios para se  intoxicarem publicamente com medicamentos homeopaticos. Como ainda cá estão este ano pretendem continuar a luta contra a pratica inconsciente da Homeopatia.

Traduzido do site:

"O desafio 10:23 é o seguimento para o protesto overdose que teve lugar na campanha 10:23 em 2010.
Protestantes internacionais de mais de 10 paises, e de mais de 23 cidades  juntar-se-hão no fim de semana de  5-6- FEV,  2011 para fazer uma simples afirmação:

 -  Homeopatia: Não há lá nada. -

O desafio culminará em Fevereiro dia 6 na QED conference em Manchester, onde 300 participantes se juntarão na maior demonstração pontual contra a homeopatia."

Página principal:
http://www.1023.org.uk/

Em Portugal:
http://1023portugal.wordpress.com/desafio-1023/

Organisado por:
http://www.merseysideskeptics.org.uk/

Sobre a conferencia QED - Question, Explore, Discover - Vai ser em Manchester e tem como participantes Simon Singh e Steven Novella entre outros. :
http://www.qedcon.org/

sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

A dor dos tolos de Kripke.

A "dor dos tolos" é um argumento a favor do dualismo mente-cerebro do filósofo Saul Kipke. Ele diz que se reconhecemos o ouro dos tolos por parecer ouro mas não ser, é a pirite, também deviamos conhecer a "dor dos tolos".  Mas ele diz que quando temos dores, temos mesmo dores, não se dá o caso de ser só parecer.

Segundo ele, se a dor fosse um estado neurológico, conseguiriamos conceber uma dor dos tolos tal que se a pessoa achasse que estava com dor ela poderia estar enganada porque não estava no estado mental da dor. Seria a dor dos tolos.

A questão é que o estado mental da dor é um padrão neuronal complexo. E não é tão simples como ter ou não ter.

Uma pessoal que ouve uma história de tortura não sente um pouco a dor imposta? Sim. É o "como se" a dor fosse real. Não é isto um candidato a dor dos tolos? Estará neste caso o estado neural igual a se a dor fosse real? Não. A sensação é a mesma? Também não. Poderia ser a mesma? Não creio, mas serve para ilustrar como a questão é enganadora.

E os "membros fantasma" que dão dores horriveis? A dor está apenas no estado mental, e a configuração é completa: a dor é real embora o membro não. Não é esta a questão que o autor pôe mas é um caso importante para avaliar a questão.

A questão é sentir dor sem ter o quadro completo de dor. Penso que não, que não será possivel ter uma sensação de dor complexa e completa sem ter todos os neuronios do padrão verdadeirso a disparar na intensidade certa. Penso que o padrão é tão complexo e envolverá tantos circuitos (como a integração com informação do género onde doi, porque doi, etc), que  só um desarranjo grande nos neuronios (loucura total com synpses inadequadas em muitos sitios) poderia dar origem a uma situação de dor relatada a nivel consciente (verbalizada ou não) sem haver todo o padrão neuronal no cerebro.  O que eu penso é que isso não objecta a posição materialista de que estados mentais são estados neurais.

Ou seja, sentir dor sem o quadro completo de dor a nivel neuronal seria antes um suporte do dualismo. Isso não acontecer num cerebro normal em condições normais - já que o como se numa pessoa lucida não tem a mesma intensidade e complexidade da dor real - só vai no sentido da equivalência mente matéria.

Eu acho que além disso, o que Kripke quer saber é se a gente pode sentir dor sem realmente a sentir.

quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

Se prever o futuro não é possivel, como é que isso ficou provado estatisticamente?


...E porque é que afirmações  extraordinarias  requerem evidencias extraordinárias.

Entre alguma controvérsia, foi aprovado para publicação numa revista com peer-review, um artigo em que apresenta 9 estudos em que 8 corroboram a existência de pré-cognição.

Os editores decidiram aceitar o artigo para publicação mas publicaram antes um artigo a explicar porquê. E a explicar porque é que o artigo não serve como evidência a suportar a capacidade de pré-cognição. Mas que serve para iniciar o debate acerca dos “standards” estatísticos usados em psicologia -  e que terá sido essa a razão pela qual aceitaram o artigo. Isso, e porque os erros que eles apontam no artigo acontecem com alguma frequência.

O resultado é um trabalho excelente sobre como se deveriam fazer os estudos cientificos em psicologia e que é aplicavel a muitas outras coisas.

Eles começam por criticar o artigo de Bem, assim se chama o autor, focando-se em 3 pontos:


1 - Estudos exploratórios versus estudos confirmatórios. 
Isto é relativo à questão do desenho dos testes. Por exemplo, neste caso, Bem, testou a capacidade de pré-cognição com recurso a vários tipos de fotografia. Só quando as fotografias foram eróticas é que o resultado foi estatisticamente válido - 53% de positivos contra 50% se fosse devido ao acaso. Em relação a outro tipo de fotografias não surgiu esse padrão. E a estatística foi feita sem os resultados dos outros tipos de fotografia. Isto sugere que o estudo deveria ser considerado um estudo exploratório e não confirmatório.
E isso é importante porque uma coisa é desenhar um teste para uma determinada hipótese, outra é ter um conjunto de resultados e andar a fazer combinações até que surja um padrão algures. O vulgar andar à pesca... Se tentarmos muito é provável que em alguma combinação surja um padrão qualquer. E isso não é totalmente indesejável. Não pode é servir de confirmação, porque esse padrão não surge espontaneamente e é meio fabricado. É preciso depois desenhar um estudo confirmatório especifico para ver se esse padrão volta a aparecer em dados completamente novos. É o mesmo problema do artigo que critiquei ontem (1) sobre a capacidade da Auto-hemoterapia estimular o sistema imunitário em que os autores foram usar o aspecto da ferida em vez do tempo de cicatrização para chegar à conclusão que chegaram. Se não fosse o aspecto podiam ainda ir tentar ver se encontravam mais alguma diferença entre os dois grupos testados para chegar à mesma conclusão e eventualmente lá encontrariam uma. Os testes tem de concluir só sobre os parâmetros que foram decididos à priori. Senão é um estudo exploratório e nada confirmatório.



2 - Falácia da inversão da condicionalidade.
Isto é, se P implica Q não quer dizer que Q implique P. Por exemplo, se estiver a chover deve haver nuvens no céu. Mas se houver nuvens no céu não quer dizer que esteja a chover.



Se nós sabemos que não existe pré-cognição por uma data de outras razões, desde a existência de casinos lucrativos a uma série de evidências físicas que mostram que o futuro não influencia o passado (ver seta do tempo e entropia nas etiquetas) porque é que em vez de aceitar o teste como refutando todos os estudos anteriores não vamos antes exigir provas muito mais fortes? Esta é a lógica por detrás do principio de Laplace de que “Alegações extraordinárias requerem provas extraordinárias”



3 – O valor p substima a hipotese nula.
Aqui a discução torna-se matemática e é complexa, mas resume-se a defender que a estatística vulgarmente usada em psicologia, (que acrescento já é a mesma usada em medicina), leva a falsos positivos. Sendo assim valor p<0,01, (usualmente aceite como servindo para um estudo conclusivo para a hipótese testada), não é suficiente. E uma abordagem Bayesiana tem de ser sempre efectuada. Neste caso, a abordagem Bayesiana resulta em favor da hipótese nula (isto é, não há pré-cognição). Vários argumentos são avançados a favor da abordagem Bayesiana. Recomendam mesmo que os estudos de psicologia de hoje em diante apresentem diversas abordagens estatísticas e refiram explicitamente onde haja contradições. A minha opinião é que o standard p menor que 0,01 vai cair. Pelo menos para 0,005 já nos próximos anos. Sendo que p=0,01 quer dizer que probabilidade do resultado que obtivemos no teste é de 1% se a hipótese nula for verdadeira. Só que 1% das vezes, ainda é uma data de vezes para que algo possa acontecer por acaso, mesmo que  os dados não tenham sido escolhidos a dedo. São muitos falsos positivos embora não possamos saber por aqui a probabilidade deles acontecerem.
Isto tem muito mais significado para coisas implausiveis do que para questões bem comprovadas em várias linhas de pesquisa. Lá está, afirmaçoes extraordinarias requerem provas extraordinarias, não provas que possam acontecer por acaso com uma probabilidade tão elevada. (Atenção: notar que 1 em cada 100 de probabilidades para que tenhamos este resultado se a hipotese nula for verdadeira não significa que em cada 100 testes haja 100% de probabilidades de ter a hipotese nula como resultado). O valor p tem sempre de ser considerado num contesto de uma probabilidade à priori.

Depois, o artigo continua com uma interessante lista de pontos que os autores consideram que têm de ser seguidos em vista destas críticas.

Um dos pontos, muito interessante, é que o objectivo e o método do estudo, incluindo o tipo de análise estatística, deve ser publicado antes do teste ser efectuado no caso de estudos que pretendam ser confirmatório. Isto de facto evitaria a possibilidade de depois se alterarem as regras e dizer: “Afinal só vamos usar os dados referentes às fotos eróticas”.

Outro ponto curioso das suas recomendações é que os participantes em estudos de temas duvidosos ou que procurem provas contra teorias bem estabelecidas, devam estar em “colaboração adversária” constante com um céptico qualificado – se bem que eu ache que esta parte do “qualificado” vá dar problemas – para desenhar e efectuar o estudo com mais credibilidade.

Como disse antes, este artigo foi escrito no âmbito da psicologia, mas penso que é um artigo que devia ter um impacto enorme desde já tanto na psicologia como em muitas outras áreas.

Via Steven Novella :

Artigo original que é aqui apresentado: “Why Psychologists Must Change the Way They Analyze Their Data: The Case of Psi”, link no artigo do Steven Novella


quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

AHT- refutação de mais estudos.

Isto começa a parecer um bocado um jogo daqueles "Whack-a-mole". É ir acertando nas tretas conforme elas saiem da toca. Os defensores da AHT vão atirando supostas provas para o ar e eu vou fazendo o "debunking" .

No ultimo "post" (a) expliquei o que era preciso e porquê. Neste aponto essas falhas nos ultimos artigos avançados pelo Olivares (b)como sendo provas da AHT.

Sei que há mais pontos de critica mas estes chegaram para inutilizar estes artigos como sendo capazes de avançar uma nova area de tratamento médico. Aqui vai, os links estão no fim.

O primeiro estudo apresentado (1) compara a autohemoterapia para a papilose bovina com um tratamento de implante autologo
(tipo auto-contaminação uma vez que para vacinação é tarde).

A doença é uma doença autolimitante na maioria dos casos e não requer usualmente tratamento, sobretudo em animais jovens. Este estudo não é cego e não tem controle com placebo. Não pode por isso dizer se o resultado foi devido ao acaso ou ao tratamento. O estudo sugere que ambos os tratamentos são ineficientes e não que a auto-hemoterapia é eficaz. Não esquecer que isto é uma doença causada por um virus que passa sozinha, normalmente não é tratada. A prevenção é feita com higiene e vacinação. Alguns casos podem evoluir malignamente mas não é referido no estudo. O tratamento usado para comparação não é um tratamento de eficácia estabelecida.

O segundo estudo (2) e outra vez na mesma doença autolimitante do anterior.  Está no entanto mais muito mais bem desenhado que o anterior mas estuda demasiadas variáveis de uma só vez. De qualquer modo ele conclui que: “Os tratamentos não apresentaram diferença significativa
quando usados em papilomas do tipo pedunculado; já o
clorobutanol e a diaminazina foram os mais eficazes no tratamento de animais com papilomas do tipo plano.
” Portanto a auto-hemoterpia não é sustentada nos resultados deste estudo, muito pelo contrário. No grupo da auto-hemoterapia dez animais melhoram e dez não. Nem é preciso matemática para concluir que é devido ao acaso.

O terceiro caso apresentado é um relatorio de fim de curso onde a Autohemoterapia aparece referida como tratamento possivel e com uma potencial explicação. Nao sao avançadas provas de que seja eficaz. De facto o excerto seguinte é tudo o que aí se encontra sobre auto-hemoterapia neste longo relatório:

“ A auto-hemoterapia promove um estímulo protéico, em casos de doenças
inflamatórias crônicas, leva a uma reativação da imunidade orgânica. Os produtos
da degradação eritrocitária são conhecidos por estimular a eritropoiese e ativar o
sistema imune normal, permitindo a manutenção da homeostasia. A auto-
hemoterapia proporciona um aumento no nível de anticorpos, capazes de ligarem
a produtos provenientes da degradação celular e assim neutraliza-los, resultando
na elevação dos níveis de linfocitotoxicinas na circulação sanguínea (SILVA et al.,
2002b). O método consiste em retirar 10ml de sangue venoso e imediatamente
aplicá-lo por via intramuscular profunda. Isto Provoca um estímulo imunológico
inespecífico, que pode levar à queda das verrugas (MELO e LEITE, 2003).


O que está ali escrito é que há indução de inflamação e que isso aumentaria a imunidade inespecifica. Só que normalmente, no caso de uma doença o corpo ja tem a inflamação e mediadores inflamatórios que precisa até em excesso, sendo muitas vezes necessário recorrer a anti-inflamatórios. Dizer que destruir células e causar inflamação ajuda a combater uma doença corrente requer evidencia clinica. Não é aqui apresentada. Mesmo a alegação de que isto cura é apenas implicita, sendo o texto bastante neutro quanto à sugestão de eficacia. Parece mais uma hipotese cuidadosamente formulada em “ pode levar à queda das verrugas”. Não suporta clinicamente a autohemoterapia como tratamento comprovado.

O quarto caso aqui apresentado pretende comprar o efeito da AHT com controle na cicatrizaçao. Não é um estudo cego e as conclusões são bizarras para dizer o mínimo. Antes de mais notar que o unico parametro objectivo importante não suporta a AHT:

Na observação cicatricial notou-se que o tempo de cicatrização para os dois grupos foi relativamente igual (aproximadamente 20 dias),” - então? Isto não devia ser o mais importante?
 No entanto como “a cicatrização apresentada pelo Grupo Desafiado foi "notoriamente mais plana, de bordas regulares com uma cicatriz final quase imperceptível.” - tudo coisas subjectivas, concluiu-se “dessa forma, a ativação do sistema imune através da aplicação de sangue antólogo intramuscular, que é o efeito proposto dessa técnica.” Mas isto não é de todo uma conclusão normal – é quase de livro para mostrar “confirmation bias”. Tinha que ser cego para estes achados serem sequer dignos de nota. Esta revista tem “peer-review”? Se tem é uma desgraça. Há mais problemas. Os animais controle foram menos manipulados, deveriam ter recebido uma injecção intra-muscular de NaCl no mínimo dos mínimos com a mesma dose usada no grupo de tratamento. Como seria de esperar eles nem dão importância à contagem leucitária na conclusão. Dizem que se aumentou a imunidade mas não falam dela. Porquê? Porque como era de esperar o que aumenta são os neutrófilos e no grupo de tratamento. É esperado. Ha destruição de células – eritrócitos e tecidos – muscular, mesmo que tenham todos os cuidados, e ainda mais stress. Mais injecções e dor o que da origem a mais neutrofilos só por si. Eficácia era ter o mesmo desempenho com menos indicadores de stress psíquico e orgânico.

Quinto estudo (5) conclui que a autohemoterapia não altera a composição do leite. Nem esperava que alterasse. Para que perder mais tempo, vamos em frente.

Sexto caso é o de um professor que diz que se trata uma determinada doença com AHT. Mas não diz em que estudos é que essa afirmação é baseada nem consigo verificar a fonte. Até prova em contrário é evidencia anedótica.

(a) http://cronicadaciencia.blogspot.com/2011/01/porque-precisamos-de-testes-duplamente.html
(b) http://www.hemoterapia.org/informacoes_e_debate/ver_opiniao/o-pessoal-que-ataca-a-ah-nao-para-nem-eu-kkkkkkk-no-blog.asp


(1)http://64.233.169.104/search?q=cache:AnXB1tVExO4J:www.famev.ufu.br/vetnot/vetnot4/res4-10.htm+auto+hemoterapia+VETERIN%C3%81RIA&hl=pt-BR&ct=clnk&cd=18&gl=br
(2)http://revistas.ufg.br/index.php/vet/article/viewFile/314/282
(3)www.upis.br/pesquisas/tcc/Andreia%20Pagnussatt.pdf
(4)http://www.unieuro.edu.br/downloads_2009/reeuni_04_004.pdf
(5) http://www.ufpel.edu.br/cic/2008/cd/pages/pdf/CA/CA_01407.pdf
(6)limk fornecido está invalido

Porque precisamos de testes duplamente cegos, controlados com placebo, com muitos casos e aleatórios.


A versão curta.

Os defensores das medicinas alternativas parecem não compreender porque esse tipo de testes é imprescindível para avaliar eficácia. A apresentação de testemunhos individuais, sem diagnósticos ou descrição rigorosa dos casos juntamente com definições que apareçam num ou noutro manual justificam escrever sobre este tema mais uma vez.

Vou tentar ser o mais sucinto possível. É preciso abordar o problema em 2 fases. Uma referente às características das doenças e pessoas e a outra a explicar onde isso encaixa na metodologia.

1 – A maioria das doenças que sofremos durante a vida são auto limitantes. Isto é, passam sozinhas a maioria das vezes. Faça-se o que se fizer, elas acabam por desaparecer.
Por isso a experiência pessoal não conta. Mesmo que seja verdadeira e acreditemos nela. Pode não ter sido efeito do tratamento mas sim da natureza. A nossa tendência para partir logo para uma relação causa efeito é uma falácia. E por isso são precisos muitos casos e comparação com placebo. Para ver se houve diferença para os que não fizeram nada. É como o provérbio de “um mês a chá de limão cura a constipação”. Claro que cura. Mesmo que se não tomar vai passar na mesma.
2- A maioria das doenças que não passam sozinhas, as doenças crónicas, têm oscilações na gravidade dos sintomas. Num mesmo individuo vão variar de uma maneira pouco previsível ao longo do tempo.
Temos então de saber que as melhoras no período relatado são de facto devidas ao tratamento e não ao acaso. Precisamos de inúmeros casos em estudo e precisamos que sejam controlados com placebo. Precisamos também que tenham sido separados ao acaso entre os dois grupos em estudo. (tratamento e controle). O placebo tem também uma importância enorme em casos crónicos pois influi no modo como as pessoas se sentem e relatam o progresso da doença. Também a tendência para a confirmação de melhoras e de guardar as melhores experiências na memória é importante neste aspecto. Há de facto uma tendência neste tipo de doenças para relatar melhoras e não perceber que é apenas o ciclo normal da doença.
3- Existe uma grande variabilidade individual na apresentação das doenças. Quer em gravidade quer em tipo de sintomatologia. Por isso os diagnósticos tem de ser rigorosos e os parametros estudados bem descritos. Deve ser o mais objectivo possivel. São precisos muitos casos, até fazer uma amostra significativa e o resultado deve vir em linguagem matemática, após análise estatistica. Raramente toda a gente melhora muito mais que o placebo. Esta é a unica maneira de saber que não é por acaso. E se for só um caso caímos na falácia da generalização apressada.
4- Existe uma tendência natural das pessoas para se recordarem dos resultados positivos ou de os procurarem sem reparar em negativos para um dado assunto.  É a “confirmation bias” já antes referida.
Por mais esta razão testemunhos individuais não servem. As pessoas que vão aparecer foram escolhidas por relatarem resultados positivos e ficamos sem saber quantos eram os negativos. Mesmo que o “cherry picking” não seja propositado ele é inevitável se a coisa não for feita objectivamente, com todos os casos anotados logo no inicio para depois podermos fazer uma estatística de qual a diferença entre os positivos e negativos e se esta pode ser atribuída ao acaso.
5 – Fraude.
Penso que não vale a pena justificar porque devemos tentar fazer as coisas de um modo que evitem a manipulação dos resultados. Nem que isso é uma tendencia natural de muita gente. É a primeira razão pela qual os testes têm de ser duplamente cegos. Nem o médico nem o paciente podem saber se estão a placebo ou a tratamento. E é a segunda razão porque devem ser randomizados. Para não escolher os que convém mais.
6-Efeito placebo.
Esta cientificamente bem estudado o efeito que a crença tem na percepção da doença e da sua evolução. O efeito em termos fisiológicos é pequeno, mas é importante no modo como o paciente se sente e vê o evoluir da doença. E pode diminuir o stress que é um parametro que diminui a eficacia do sistema imunológico quer em pessoas quer em animais. É a segunda razão pela qual os testes tem de ser duplamente cegos. O placebo é mais forte quanto mais a pessoa acreditar que está a ser tratada. Por isso ela não pode saber. E o médico, para evitar a tendência para encontrar positivos também não. É preciso distinguir o efeito do medicamento em si do efeito placebo. Tudo tem efeito placebo. O que é dificil é encontrar tratamentos que vão além do placebo. É casos para dizer que placebos há muitos, tratamentos é que não. O efeito placebo não é um efeito do medicamento diretamente. É muito mais um efeito da crença no tratamento. Por isso o teste tem de comparar a eficacia do medicamento  com o efito placebo. Se o medicamento não é mais eficaz é porque tudo o que estamos a assistir é efeito placebo.


7-Sistemas complexos.
O nosso organismo é um sistema de complexidade elevada, sujeito a influência de um meio externo quase igualmente tão complexo. É por isso necessário reduzir o numero de variáveis que estão em estudo, quer intrínsecas ao paciente quer extrínsecas. Para isso é preciso um diagnóstico rigoroso dos casos, bem documentado e feito por clínicos experientes. É feita a tentativa de todas as pessoas do estudo estarem sujeitas às mesmas condições, e tem de haver um tipo de controle – o placebo – que deve mimetizar o processo ou principio activo estudado em tudo menos no que está em causa. Isto é, a administração tem de ser imitada, a forma, a interacção com os pacientes, etc. E é por isto que o desenho do estudo é tão importante. Tem de ser desenhado para estudar a variável em causa e deve ter-se previsto qual a melhor maneira de o fazer. Tudo deve ser rigorosamente descrito para que possa ser reproduzido, e verificado independentemente. Se não for assim, nem é possível discutir o assunto pois a informação não presta

Saber mais (sugestões):

Pesquisar "confirmation bias", "anedotical evidence" na internet.
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segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

Não há panaceias universais. É de desconfiar logo aí.

No site "Amigos da Cura" (1) podemos encontrar uma série de blogs (todos com o mesmo tema) com as mais incríveis promessas: Como por exemplo de que todas as doenças têm cura (2) e mesmo relatos de recuperações "fantasticas" de paralisia crónica (3). Claro que também ha um texto sobre como a Novartis pretende eliminar toda a população do mundo através da vacina na gripe, mas isso ja está batido (4). Tem muita coisa do género (5). A minha opinião é... Não!


Este tipo de promessas milagrosas, com trechos de testemunhos alegadametne escritos por pessoas que beneficiaram das terapias, cheios de emoçao, apelam sobretudo para pessoas desesperadas. Estão mais vulneraveis. Acreditam mais facilmente. E são abusadas.

Fazer este tipo de alegaçoes - e este "site" esta cheio delas - sem apresentar provas consistentes e completas e' em si um abuso. Abuso de pessoas que podem preterir melhores tratamentos a estas alegadas panaceias universais, tal qual a mitologica "banha da cobra".

E quem faz os diagnósticos? Quem é que se preocupa em saber realmente o que têm os doentes? Isso não devia ser feito por médicos qualificados?

Atrasos no tratamento e diagnostico são perigos palpáveis e com consequências potencialmente graves.  Felizmente que as doenças mais frequentes são também autolimitantes, isto é, passam sozinhas - com ou sem tretas.  Mas se passam sozinhas não precisam de tretas. E se não passam precisam de um tratamento especifico. e de acompanhamento médico a sério Não de uma coisa que dizem que dá para tudo mas que tem menos provas dadas que uma alface a competir nos 100 metros barreiras e menos plausibilidade científica que a música dos Beatles cure a lepra.

A juntar ao insulto a injuria ainda se faz menção de grandes conspiraçoes, como se as grandes farmaceuticas fossem o diabo. Claro que fazem umas asneiras, claro que fazem umas trafulhices. São regidas por homens.

Mas sao obrigadas a apresentar resultados que sustentem as afirmaçoes que fazem. Sao obrigadas a ser responsaveis por aquilo que colocam no mercado. Ou seja, fazem mais do que fazem as alternativas, que não são nem medicinas, nem alternativas a nada.


Para acabar deixo-vos com a nota final do texto de que "tudo tem cura":




" Como uma nota final: para aqueles de vocês que continuam a acreditar que a grande
mentira que a dura e ineficazes opções oferecidas pela medicina são superiores à
natureza, eu pergunto : Quando Deus se tornou um charlatão?"(2)

A questão não está nem aí. Ninguém está a sair daqui vivo e doenças não é preciso procurar por elas. Que  especie de lógica é esta? Estamos todos a viver para sempre e eu não dei por nada?


Quem quiser voltar para a idade média, tomar decisões baseadas em superstição, ter como conhecimento o "diz-que-disse", e viver a merce de  vendedores de poções da juventude - que o faça sozinho e por teimosia. Hoje há melhor. Há o conhecimento cientifico. Ignorar isso e apresentar outras verdades sem plausibilidade cientifica e sem provas tem outro nome.

Nao e' amigos da cura. E' amigos de outra coisa.



(1)http://amigosdacura.ning.com/
(2)http://amigosdacura.ning.com/profiles/blogs/toda-a-doença-tem-cura
(3)http://amigosdacura.ning.com/profiles/blogs/miastenia-gravis-diabetes
(4)http://amigosdacura.ning.com/profiles/blogs/a-vacina-ou-hemoterapia
(5)Por exemplo tratar com a mesma coisa - autohemoterapia - todo este leque de doenças:  "Cancro, diabetes, miastenia gravis, lupus, herpes"... no mesmo link de (3)

Como fazer o seu próprio placebo:

Para enfrentar a crise, o "Crónica da Ciência" vai mostrar-lhe como pode evitar gastar um dinheirão em pulseiras de equilibrio, acupunctura, auto-hemoterapia e outras medicinas alternativas que funcionam por efeito placebo.

Vou ensinar-lhe a fazer o seu próprio placebo. SIM - VOCÊ TAMBÉM PODE! Use este poder que lhe dou.

É muito simples.

Primeiro, arranje um frasco com tampa, até pode ser daqueles do café solúvel (depois de lavado).

Segundo, imprima a imagem deste post numa impressora de qualidade (mais embaixo). Use papel premium e todas as definições de impressão que gastem mais tinta.

Terceiro, recorte o rótulo. Este passo é muito importante. Se se enganar imprima outro rótulo e tente de novo. Tem de ficar perfeito. Depois, pegue no frasco e cole-lhe o rótulo da imagem que aqui deixo. Encha de agua.

Quarto: Repita alto - "Isto é para (problema em causa) e vai me tratar". Se se enganou repita outra vez. Ponha a tampa.

Quinto: siga as instruções do rótulo.


E AGORA A LISTA DE TESTEMUNHOS ANEDÓTICOS TÍPICOS DESTAS COISAS:

Maria Jaquina (Física de foguetes): "Desde que faço o meu próprio placebo deixei de ter queda de dentes. Desde que o comecei a tomar o mês passado ainda não me caiu nenhum."

Alberto Figuera (Neurocirurgião): "Gastei uma fortuna em pulseiras mágicas para não cair na cirurgia, e agora de graça resolvi o meu problema. Já não causo paralisia a nenhum paciente ha uma semana. O placebo caseiro é o melhor!".

Maria Topolina (cabeleireira): "Eu tinha uma mau olhado em cima e desde que faço o meu próprio placebo tudo me corre bem. Estou muito feliz e toda a minha familia também".


Milhares de pessoas em todo o mundo já conheciam este segredo milenar. Junte-se a eles.


PS: Isto é tudo a gozar, ok? É que se bem que o efeito placebo seja real e tudo tem efeito placebo conforme se acredite ou não, o que é importante é que faça mais que o placebo. Precisamente porque placebos há muitos. Príncipios activos eficazes é que não.

sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

Autohemoterapia - fracas (muito fracas) evidências para tão grandes alegações.

A auto-hemoterapia é a prática supostamente médica de usar o próprio sangue de um paciente para o tratar, tirando 10 a 20ml de uma veia e depois administrando via intra-muscular.

Não só isto não faz sentido como não existem artigos rigorosos e metodologicamente correctos a sugerir que isto funcione mesmo que seja por algum mecanismo mal compreendido. Foi a conclusão a que cheguei (1) quando pesquisei para escrever a primeira vez sobre o assunto no blogue e foi a conclusão a que chegou o Dr Leandro (2) no seu blog.

Em defesa da auto-hemoterapia, o Joel Martini de Campos, que suponho já ter sido aqui comentador também, avança com 2 links. Só li aindacompletamente o primeiro, o que já justifica este post. 

É um artigo de 1940, que diz ter sido publicado na revista Brasil-cirurgico por Jésse Teixeira. É logo mau sinal ser um artigo tão antigo a aparecer numa pequena lista como suporte de uma pratica médica que alega servir para tanta coisa. Normalmente artigos de 1950 para trás so servem para dizer em que ano se descobriu determinada coisa, não para sustentar a sua pratica clínica nos dias de hoje. Mas pelos vistos os auto-hemoterapicos não têm muito melhor para apresentar.

E a leitura do artigo revela logo uma serie de problemas. Nos dias de hoje não seria aceite nem como trabalho de faculdade do primeiro ano.

 - Esta extremamente mal citado. Não há referencias para lá do nome próprio e apelido de quem diz o que.

 - As conclusões que tira estão fora do ambito do tema principal do artigo - o que mostra que não foi desenhado para esse fim.

 - Não é um estudo com controle com placebo.

 - Não é um estudo cego em que nem paciente nem médico sabe o que está a administrar no tratamento. É importante para afastar tentativas de fraude, contornar o efeito placebo além da tendencia natural humana para confirmação positiva (confirmation bias).

Isto seria na melhor das hipoteses um artigo se screening em que a conclusão seria que são precisos mais estudos. Mas estamos em 2011 e ainda é apresentado como prova. Prova de que é treta, só pode.

Faz afirmações como "foi muito mais rápido do que se não se tivesse usado auto-hemoterapia". Mais rápido comparado com que? Placebo? Não. Tratamento normal? Também não sabemos, não há qualquer espécie de controle. Como foi a evolução ao longo dos dias? Também não sabemos. 

O segundo link vai dar aqui (3). E para além da noticia linda de um apresentador de televisão que cura um paciente com cancro. Tem mais uns 10 artigos. Muito pouco. Segui o primeiro (4) porque era de veterinária.

É o artigo sobre um caso único, de uma época em que ainda não se sabia que o tumor venereo transmissivel ou Sarcoma de Sticker era causado por um virus - ou pelo menos o artigo não menciona isso - e em que diz que se fez auto-hemoterapia antes de se aplicar um tratamento que se sabe ser extremamente eficaz.

Diz que depois da auto-hemoterapia o tumor diminuiu de tamanho - não diz quanto - e deixou de sangrar. É possivel que tenha deixado de sangrar... Mas isto é quase a definição de "confirmation bias". Pequenas coisas que servem para confirmar algo como positivo. É uma tendencia natural humana. E chama-se a este tipo de estudos evidência anedótica. (um caso, sem controle, não cego, poucas alterações consideradas como sucesso).

Não li mais. Mas suponho que são todos assim. Não servem para provar uma area nova na medicina.

Grandes afirmações requerem grandes provas. É preciso explicar porque? 

PS: O autor original teve de fechar os comentários. Qualquer tentativa de SPAM, sob qualquer aspecto, será como outras vezes, apagada. Para deixar opinião não é preciso escrever 1000 vezes a mesma coisa. Isso não a torna verdade. Quem quiser um "blogue" para escrever sobre os mesmos assuntos que faça um, se quiserem eu até ajudo a começar (conheço o Blogger, não é?), mas na realidade é muito fácil.

(2)http://leonardof.med.br/2010/07/07/auto-hemoterapia-nao-tem-comprovacao-cientifica/
(3)http://www.rnsites.com.br/auto-hemoterapia.htm#TOPO
(4)http://www.rnsites.com.br/Auto-Hemoterapia-cadela.pdf

terça-feira, 4 de janeiro de 2011

Liberte o climatologista que há em si.

É muito facil. Basta ser-se decidido, escolher umas quantas tretas e falar como se ninguém mais tivesse a mínima ideia do que anda a fazer. E claro, negar o aquecimento global. Porque para defender a posição oposta tem de se fazer ciência e isso não é engraçado.

Quando alguém protesta basta responder: "A ciência não explica tudo".

E se ainda acrescentarem que isso é um apelo à ignorancia, (uma falácia conhecida), reponda que "é apelo à ignoracia sim, mas a ignorância é sua e não minha." - E esta provado.

Afinal porque não dar liberdade ao nosso climatologista interior? No fundo sabemos todos falar sobre o tempo melhor do que qualquer outra coisa. E se ja somos todos peritos em medicinas alternativas podemos também ser todos peritos no clima. E para mais, o aquecimento global só acontece uma vez por ano e meses depois volta a arrefecer. E é só em metade do planeta de cada vez.

PS: Falácia do espantalho? Era bom sinal que fosse...

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Brevemente na area da construção civil. Aposte nesta empresa em desenvovimento líder do sector. Pronabo!

segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

Colículos e consciência.

A integração da informação proveniente do ambiente - através dos orgãos dos sentidos - é essencial para a sensação de se estar dentro do corpo(1). A incapacidade do cerebro poder fazer o cruzamento desta informação adequadamente dá origem a uma sensação de "fora do corpo" (out-of-body).

Parece razoavel aceitar que para a emergência da mente, (do sentimento do Eu), seja nesseçário para além disso, uma integração com as próprias percepções vindas do corpo (somáticas), que refletem o estado emocional em que estamos (2).

Os colículos são uma estrutura cerebral onde isso acontece:


"As camadas profundas do colículo superior contêm, além de um mapa do mundo visual, mapas topográficos de informação audiotiva e somática, sendo estes ultimos oriundos da espinal medula e do hipotálamo.

As três variedades de mapas - visual, auditivo e somático - mantêm um registo espacial. Isso significa que se encontram alinhados de uma forma tão precisa que a informação disponivel num dos mapas, por exemplo o da visão, corresponde à informação de outro mapa relacionado com a audição ou com o estado corporal."

Citado do "Livro da Consciencia" de António Damásio, Circulo de Leitores.

De notar que de modo algum isto significa que a consciencia é produzida nos colículos. Significa sim que é provavel que estes participem na formação dessa consciencia, provavelmente mais que muita outras areas.



(1) http://www.theness.com/neurologicablog/?p=749
(2) Ver "O erro de Descartes" também de António Damásio.

domingo, 2 de janeiro de 2011

A confusão dentária antropológica está na divulgação e percepção.

Os dentes encontrados recentemente nas escavações Israelitas têm ressonado nos média – e sobretudo nos comentários que originam (1) - como uma anomalia à teoria “out of africa” e mesmo à teoria da evolução. Bastou procurar o ”abstract” para perceber melhor que estes dentes não são exactamente iguais aos dentes que temos hoje, mas sim correspodendentes a uma forma mais antiga e provavelmente entre nós e os Neanderthais (com quem trocámos genes).

Para  simplificar apenas traduzo o “abstract”, que fala por si:

“Este estudo apresenta a descrição e análise comparativa de dentes deciduos e permanentes do Pleistoceno médio localizados em uma gruta em Qesem (Israel). Todos os fosseis humanos [conhecidos]foram identificados como pertencendo ao complexo cultural Acheulo-yabrudiano (AYCC) do Paleolítico inferior tardio. A idade (200 a 400 ka) dos dentes de Qesem do Pleistoceno médio, coloca-os cronologicamente antes que a maioria dos fosseis de de espécies de hominídeo previamente conhecidas do sudoeste da Ásia. Três dentes permanentes mandibulares(C1 – P4) foram encontrados em proximidade com a parte inferior da sequencia de estrados [geológicos]. As pequenas dimensões das coroas indicam um considerável grau de redução apesar das raízes serem longas e robustas. Em contraste, três dentes maxilares (I2,C1 e M3) e dois deciduos isolados que foram encontrados na parte de cima da sequencia [de estratos geológicos] são muito mais largos e mostram alguns traços de plesiomorfismo semelhantes aqueles de espécimes de  Skhul/Qafzeh. Apesar de nenhum dos dentes de Qesem mostrar uma conjunto de características de Neandertal, um pequenos conjunto de caracteres mostra afinidade com membros desta linhagem evolucionária. Contudo o balanço de evidencias sugere uma afinidade mais próxima com o material dentário de Skhul/Qafzeh, apesar de muitas destas semelhanças provavelmente representarem características de plesiomorfismo [partilha de características por via ancestral].”

A ligação para o abstract:
http://onlinelibrary.wiley.com/doi/10.1002/ajpa.21446/abstract

(1) http://www.publico.pt/Ciências/dentes-humanos-encontrados-em-gruta-de-israel-sao-mais-antigos-do-que-homem-moderno_1473109

PS: Hoje (3-Jan-2011) a Nature traz um artigo sobre o assunto onde também critica os média e faz menção a dois bloggers que denunciam a falta de rigor das noticias: " The discrepancy between the media coverage and the paper was seized upon by science bloggers Carl Zimmer and Brian Switek, who objected to the hype around the research." aqui: http://www.nature.com/news/2010/101231/full/news.2010.700.html