Ja vimos que a definição de omnipotente não pode ser realmente omniponte. À priori isso é impossivel. Pois teria o ser omnipotente de ser capaz de fazer algo que ele próprio não seja capaz de fazer. Por isso a definição de omnipotencia tem de ser algo como "quase omnipotencia".
E à posteriori, na pratica? Como pode ser minimamente omnipotente e omnisciente e não ter efeitos no mundo fisico? Só se for a sua vontade que não seja detectado. Só se for a sua omnipotencia que é capaz de fazer que tudo seja como se deus não existisse.
Então se deus não quer ser encontrado como é que a religião diz tanto sobre ele? Só há duas respostas. Ou existem pessoas (umas e não outras) que deus escolhe para transmitir a sua mensagem ou a religião inventa.
Mas não dando deus a essas pessoas nenhuma ferramenta que permita darem a certeza às outras de que contactam com deus como é que é suposto escolhermos em quem acreditar?
Deus portanto espera que a nossa liberdade seja baseada no palpite? Eu acho que isso é contra o livre arbitrio. Se não temos informação para fazer uma boa escolha então vamos ver a nossa liberdade diminuida. Por falta de informação. Que deus decidiu não dar igual a todos. Isso não so não é justo como não faz sentido com o livre arbitrio que é suposto ser a razão pela qual nos acontecem acidentes.
Portanto a razão pela qual há coisas que limitam a nossa liberdade é para não nos limitar a liberdade? Isso não faz sentido. Liberdade é poder escolher a melhor opção de acordo com as nossas preferencias. Liberdade não são escolhas cegas.
E é isso que se pede. É que faça-mos a escolha cega de acreditar. Sem razão nenhuma para além de que " a ciência não explica tudo". Que neste contexto é o mesmo que dizer: "porque eu vejo a luz e tu não".
Mas isso é como todas as outras crenças. É apenas um apelo à credulidade. As medicinas alternativas, o espiritismo, a magia negra, etc. Essas coisas que só funcionam em quem acredita que o que está a acontecer é devido a elas e não ao funcionamento banal do universo.
O que não está na fisica e só está na metafisica é por definição fantasia.
Não é radical dizer que não acredito no que não se distingue de qualquer outra fantasia. Não é radical dizer que isso é um engano. É bastante plausivel. E é importante escrever sobre isso enquanto a verdade for importante e tivermos vontade de conhecer o universo que nos rodeia.
Cepticismo, naturalismo e divulgação científica. Uma discussão sobre o que é ou não matéria de facto.
Páginas
- Página inicial
- Teoria da Relatividade
- Mecânica Quântica
- Criacionismo
- Ciência
- Teoria da Evolução
- Medicinas Alternativas
- Astrologia
- Aquecimento Global Antropogénico
- Importância do Consenso Científico
- Teorema de Godel
- Evidência Anedótica
- Propriedades emergentes e a mente.
- Leitura a frio vs mediunismo/etc.
- O que é o cepticismo?
quinta-feira, 14 de outubro de 2010
quarta-feira, 13 de outubro de 2010
Deus, o mapa e o território.
O Prof. Alfredo Dinis continua a sua série de textos dedicados ao ateísmo moderno - a que chama de radical apenas porque é tão afirmativo acerca da inexistência de Deus do mesmo modo que ele próprio é acerca da existência. Eu acho isso um exagero inconsistente.
Não percebo esta argumentação:
Não é radical defender a existência de uma entidade para a qual não há ponta de evidencia e ainda divulgar leis morais derivadas dela. Mas responder que isso é um apelo à credulidade sem sentido racional nenhum já é.
E dizer que a ciência não pode - como que por decreto - estudar a existência de Deus pelos vistos também não é radical. A ciência estuda a realidade, seja ela como for, e se Deus é real então está no âmbito da ciência. Só se não existir é que não pode estudar. Claro que há coisas que não conseguimos medir ou testar, umas porque envolvem muitas medições, outras porque são poucas mas praticamente impossíveis - como o que pensava Afonso Henriques sobre a sua mãe - mas nenhuma destas impossibilidades é essencialmente algo que transfira para o palpite ou a metafisica o que são dados científicos ainda que inacessíveis. Eu também não sei o que está a 5 metros debaixo do chão agora que escrevo isto, mas isso não deixa de ser, como as questões anteriores, um problema muito mais circunstancial e dependente do processo do que da natureza das coisas em si. Ainda não podemos ler pensamentos e não sei se vai um dia ser possível, mas tudo indica para que não haja nada que impeça a explicação de como se formam esses pensamentos.
A ciência não explica o que não existe. Explica o que existe de acordo com o que se pode saber. E cientificamente, em rigor, se nada há a que se possa atribuir a uma determinada entidade, então essa hipótese é descartada. É a hipótese nula. É a lamina de Occam. Começou por ser filosofia e Aristóteles colocou assim a questão: "As entidades não devem ser replicadas para além do necessário".
Mas Deus existe. Os crentes sabem e sentem. Deus é amor. Deus é metafisico. Deus pertence a outro nível, pertence ao mundo das ideias. Certo. É um facto.
Como uma poesia sobre o por-do-sol, Deus é algo que... Não é inerente à realidade. É inerente a quem vê esse por-do-sol e descreve uma mistura do que vê e do que o que esse por-do-sol faz sentir. Mas o que sente pertence a si. Não à realidade exterior. É realidade enquanto sentimento. E isso é tudo o que nós podemos saber de Deus. É que algumas pessoas o sentem em si. O amam. O vêem em todo o lado.
Mas tal como o por-do-sol é representado por um conjunto de padrões neuronais capazes de desencadear várias reacções no organismo, idem para o conceito de Deus. Deus é algo intrínseco ao ser humano. É interior. E nesse aspecto é real. Tão real como a cabeça. Apenas é mapa e não território. Tal como a sensação que o por-do-sol desencadeia no cérebro é um mapa de sensações e padrões, Deus também é mapa. Não está na realidade.
E a melhor ferramenta que a humanidade criou para descrever a realidade foi a ciência. É de tal modo boa que os crentes já nem querem argumentar que Deus esta nas coisas que a ciência não descreve ainda (embora estejam sempre a resvalar para lá). Insistem que Deus esta nestas mesmas coisas que a ciência descreve sem precisar de recorrer a deuses. Insistem que sabem que Deus esta lá apesar de os melhores esforços racionais mostrarem precisamente que não esta. E dizem que esta "metafisicamente"... Pois está. Está lá para quem o vê lá. Mas é propriedade de quem vê e sente e não da realidade. Essa continua indiferente à crença. E é por isso que sabemos que Deus é apenas mapa e não território. É porque a ciência mostra como tudo se passa como se Deus não existisse. E como é bem mais fácil de compreender se o considerarmos algo na mente.
Se algo não é distinguível de um fantasia é porque provavelmente é uma fantasia. Para todos os efeitos (distintos da crença), Deus não existe. Tal como um medicamento que apenas tem efeito placebo - que é efeito da crença -se conclui que não funciona, se acerca de Deus tudo o que sobra é efeito da crença, então é porque é efeito da crença. Não que há um Deus para justificar a crença. Porque crenças há muitas. E é precisamente a ciência que tem sido melhor capaz de distinguir as que correpondem à realidade e quais estão apenas na mente.
O Prof. Alfredo Dinis cita a N.A.S. para defender a sua ideia de que a ciencia não pode dizer nada acerca de deus. É uma asneira. É uma afirmação politica. Foi originada não pelo conhecimento cientifico mas por uma escolha de se querer inserir e ser aceite na sociedade crente da America. Porque a verdade é que sabemos que a maioria dos seus membrossão ateus.
A verdade é que não falta nada para mostrar que deus não existe. A unica maneira é aceitar o palpite como sendo uma forma de conhecimento. E dizer que o mapa e a realidade são uma e a mesma coisa. Mas nem tudo o que vem à mente correspode ao que se passa na realidade ca fora. E para isso a ciencia é a melhor aposta. E a ciencia descreve outras entidades e processos que não um omnipotente, omnipresente, omniscienciente, bom e justo! Quem diz que tal coisa existe é que devia avançar com provas. E bem solidas. Andar para aí a dizer que isto e aquilo é verdade é facil. Mostrar que é mesmo verdade é que é dificil. E no entanto o radical sou eu.
Não percebo esta argumentação:
Não é radical defender a existência de uma entidade para a qual não há ponta de evidencia e ainda divulgar leis morais derivadas dela. Mas responder que isso é um apelo à credulidade sem sentido racional nenhum já é.
E dizer que a ciência não pode - como que por decreto - estudar a existência de Deus pelos vistos também não é radical. A ciência estuda a realidade, seja ela como for, e se Deus é real então está no âmbito da ciência. Só se não existir é que não pode estudar. Claro que há coisas que não conseguimos medir ou testar, umas porque envolvem muitas medições, outras porque são poucas mas praticamente impossíveis - como o que pensava Afonso Henriques sobre a sua mãe - mas nenhuma destas impossibilidades é essencialmente algo que transfira para o palpite ou a metafisica o que são dados científicos ainda que inacessíveis. Eu também não sei o que está a 5 metros debaixo do chão agora que escrevo isto, mas isso não deixa de ser, como as questões anteriores, um problema muito mais circunstancial e dependente do processo do que da natureza das coisas em si. Ainda não podemos ler pensamentos e não sei se vai um dia ser possível, mas tudo indica para que não haja nada que impeça a explicação de como se formam esses pensamentos.
A ciência não explica o que não existe. Explica o que existe de acordo com o que se pode saber. E cientificamente, em rigor, se nada há a que se possa atribuir a uma determinada entidade, então essa hipótese é descartada. É a hipótese nula. É a lamina de Occam. Começou por ser filosofia e Aristóteles colocou assim a questão: "As entidades não devem ser replicadas para além do necessário".
Mas Deus existe. Os crentes sabem e sentem. Deus é amor. Deus é metafisico. Deus pertence a outro nível, pertence ao mundo das ideias. Certo. É um facto.
Como uma poesia sobre o por-do-sol, Deus é algo que... Não é inerente à realidade. É inerente a quem vê esse por-do-sol e descreve uma mistura do que vê e do que o que esse por-do-sol faz sentir. Mas o que sente pertence a si. Não à realidade exterior. É realidade enquanto sentimento. E isso é tudo o que nós podemos saber de Deus. É que algumas pessoas o sentem em si. O amam. O vêem em todo o lado.
Mas tal como o por-do-sol é representado por um conjunto de padrões neuronais capazes de desencadear várias reacções no organismo, idem para o conceito de Deus. Deus é algo intrínseco ao ser humano. É interior. E nesse aspecto é real. Tão real como a cabeça. Apenas é mapa e não território. Tal como a sensação que o por-do-sol desencadeia no cérebro é um mapa de sensações e padrões, Deus também é mapa. Não está na realidade.
E a melhor ferramenta que a humanidade criou para descrever a realidade foi a ciência. É de tal modo boa que os crentes já nem querem argumentar que Deus esta nas coisas que a ciência não descreve ainda (embora estejam sempre a resvalar para lá). Insistem que Deus esta nestas mesmas coisas que a ciência descreve sem precisar de recorrer a deuses. Insistem que sabem que Deus esta lá apesar de os melhores esforços racionais mostrarem precisamente que não esta. E dizem que esta "metafisicamente"... Pois está. Está lá para quem o vê lá. Mas é propriedade de quem vê e sente e não da realidade. Essa continua indiferente à crença. E é por isso que sabemos que Deus é apenas mapa e não território. É porque a ciência mostra como tudo se passa como se Deus não existisse. E como é bem mais fácil de compreender se o considerarmos algo na mente.
Se algo não é distinguível de um fantasia é porque provavelmente é uma fantasia. Para todos os efeitos (distintos da crença), Deus não existe. Tal como um medicamento que apenas tem efeito placebo - que é efeito da crença -se conclui que não funciona, se acerca de Deus tudo o que sobra é efeito da crença, então é porque é efeito da crença. Não que há um Deus para justificar a crença. Porque crenças há muitas. E é precisamente a ciência que tem sido melhor capaz de distinguir as que correpondem à realidade e quais estão apenas na mente.
O Prof. Alfredo Dinis cita a N.A.S. para defender a sua ideia de que a ciencia não pode dizer nada acerca de deus. É uma asneira. É uma afirmação politica. Foi originada não pelo conhecimento cientifico mas por uma escolha de se querer inserir e ser aceite na sociedade crente da America. Porque a verdade é que sabemos que a maioria dos seus membrossão ateus.
A verdade é que não falta nada para mostrar que deus não existe. A unica maneira é aceitar o palpite como sendo uma forma de conhecimento. E dizer que o mapa e a realidade são uma e a mesma coisa. Mas nem tudo o que vem à mente correspode ao que se passa na realidade ca fora. E para isso a ciencia é a melhor aposta. E a ciencia descreve outras entidades e processos que não um omnipotente, omnipresente, omniscienciente, bom e justo! Quem diz que tal coisa existe é que devia avançar com provas. E bem solidas. Andar para aí a dizer que isto e aquilo é verdade é facil. Mostrar que é mesmo verdade é que é dificil. E no entanto o radical sou eu.
sexta-feira, 8 de outubro de 2010
Percepção dos consensos científicos.
Um tema recorrente neste blogue tem sido a aceitação pelo público em geral dos resultados científicos. Tenho exposto várias vezes a minha posição acerca da importância dos consensos científicos na divulgação e na pedagogia e defendido a sua importância real - representam provavelmente a melhor teoria para a informação que há disponível.
Os consensos científicos têm importância dentro da progressão do conhecimento científico pois permitem a formação de paradigmas de pesquisa, mas o facto de um cientista argumentar fora do consenso não é um argumento contra ele próprio. Na realidade é isso que permite avançar a ciência, é a abertura à refutação de toda e qualquer teoria. Mas essa refutação tem de ser bem feita. Não é apenas negar e "dizer mal".
Quando uma pessoa vulgar (no sentido de ser leigo em determinada matéria), permite que a sua opinião ou intuição se sobreponha àquilo que os especialistas de uma área dizem, algo está errado. E normalmente não o fazem por saber argumentar a nível científico a sua posição. Preferem para isso escolher um cientista que defenda aquilo em que acreditam (e há muitas vezes um cientista algures a defender aquilo que acreditam, é só fazer um "cherry-picking") e acusar os outros cientistas (neste caso a maioria) de coisas que a ciência se mostrou a melhor forma de combater. Como fraude, dogmatismo, perspectiva cultural, interesses económicos e pessoais, etc. Não que não existam; fazem parte da natureza humana e a ciência é feita por homens e mulheres. Apenas que a metodologia sistemática da ciência tem uma série de mecanismos que minimizam precisamente estes problemas, tendo dado resultados muito além de qualquer outra abordagem conhecida.
Outra acusação é o apelo à ignorância de que "a ciência não explica tudo", algo que até já vi professores universitários escreverem para arranjar um buraco onde enfiar as suas crenças.
É importante reparar na uniformidade que apesar de tudo existe na ciência. Enquanto que a opinião pública é extremamente heterogénea nas suas crenças, em ciência, por comparação, emergem verdadeiros consensos entre os especialistas. Num meio onde a evidência experimental e a matemática são a autoridade, isto acontece. Alguma coisa deve querer dizer, não?
No entanto o público continua a deixar as suas ideias anteriores ou perspectivas culturais afectarem de modo definitivo a opinião que fazem do que significa um consenso científico, achando que o que pensam pode ultrapassar o que o conhecimento acumulado de especialistas diz.
Um estudo recente estuda a hipótese da relação dessa parcialidade estar ligada ao risco que as ideias cientificas representam para as ideias da sua visão cultural. (luta de memes?) Os resultados são em linha com o esperado e deram origem a este post. É em função da dissonância com os seus valores e conceitos anteriores que uma teoria cientifica é julgada por um leigo. Isto está francamente errado.
Argumentar contra uma teoria científica não pode ser feito porque não gostamos dela. Isso dá de facto origens a "teorias da conspiração", falácias variadas e acusações de fraude implausíveis e não a argumentos científicos que requerem muitas vezes ser-se um verdadeiro especialista da matéria. Se não sabemos argumentar consistentemente se calhar é porque não sabemos o suficiente para ter uma opinião tão forte... Digo eu.
Não penso que as pessoas devam ser levadas a aceitar acriticamente seja o que for, mesmo se tiver o rótulo de ciência. Mas penso que se deve afirmar que a verdadeira abertura de espírito é aceitar a realidade como ela é. Aceitar as evidências pela sua importância real e não pelo que elas representam para determinadas culturas. E discutir abertamente os problemas tentando não deixar as nossas convicções pessoais toldarem- nos o raciocínio.
Pode ser tentador acreditar num mundo em que temos poderes curativos tipo Reiki, ou que podemos por vértebras no sitio carregando com os dedos ou espetando agulhas. Ou até, que se pode largar CO2 à vontade - que isso do aquecimento antropogénico é mania dos ambientalistas. Mas estas coisas têm evidência científica forte de que estão erradas. E a discussão não pode ser reduzida a chavões típicos de quem não tem melhores argumentos, como "a ciência não explica tudo logo tal e tal deve ser verdade" ou "isso é verdade porque a minha intuição mo diz" ou até "isso não pode ser verdade, já viste o problema que era?". Tudo raciocínios falaciosos. A discussão deve ser guiada para saber qual é a melhor explicação possível. E essa é em regra a da ciência. Diria mesmo que quando a explicação científica não é a melhor é porque não há maneira de saber mais, e apesar de poder estar errada não há razão para escolher à sorte outra. Porque na maioria das vezes isso é a aposta errada.
Ter verdadeiramente a mente aberta é ser capaz de aceitar as evidências. Não é aceitar toda a casta de tretas excepto aquelas que não dizem o que nós queremos.
Via Neurologica, do Steven Novella,
o artigo referido é este:
http://www.informaworld.com/smpp/content~db=all?content=10.1080/13669877.2010.511246
Os consensos científicos têm importância dentro da progressão do conhecimento científico pois permitem a formação de paradigmas de pesquisa, mas o facto de um cientista argumentar fora do consenso não é um argumento contra ele próprio. Na realidade é isso que permite avançar a ciência, é a abertura à refutação de toda e qualquer teoria. Mas essa refutação tem de ser bem feita. Não é apenas negar e "dizer mal".
Quando uma pessoa vulgar (no sentido de ser leigo em determinada matéria), permite que a sua opinião ou intuição se sobreponha àquilo que os especialistas de uma área dizem, algo está errado. E normalmente não o fazem por saber argumentar a nível científico a sua posição. Preferem para isso escolher um cientista que defenda aquilo em que acreditam (e há muitas vezes um cientista algures a defender aquilo que acreditam, é só fazer um "cherry-picking") e acusar os outros cientistas (neste caso a maioria) de coisas que a ciência se mostrou a melhor forma de combater. Como fraude, dogmatismo, perspectiva cultural, interesses económicos e pessoais, etc. Não que não existam; fazem parte da natureza humana e a ciência é feita por homens e mulheres. Apenas que a metodologia sistemática da ciência tem uma série de mecanismos que minimizam precisamente estes problemas, tendo dado resultados muito além de qualquer outra abordagem conhecida.
Outra acusação é o apelo à ignorância de que "a ciência não explica tudo", algo que até já vi professores universitários escreverem para arranjar um buraco onde enfiar as suas crenças.
É importante reparar na uniformidade que apesar de tudo existe na ciência. Enquanto que a opinião pública é extremamente heterogénea nas suas crenças, em ciência, por comparação, emergem verdadeiros consensos entre os especialistas. Num meio onde a evidência experimental e a matemática são a autoridade, isto acontece. Alguma coisa deve querer dizer, não?
No entanto o público continua a deixar as suas ideias anteriores ou perspectivas culturais afectarem de modo definitivo a opinião que fazem do que significa um consenso científico, achando que o que pensam pode ultrapassar o que o conhecimento acumulado de especialistas diz.
Um estudo recente estuda a hipótese da relação dessa parcialidade estar ligada ao risco que as ideias cientificas representam para as ideias da sua visão cultural. (luta de memes?) Os resultados são em linha com o esperado e deram origem a este post. É em função da dissonância com os seus valores e conceitos anteriores que uma teoria cientifica é julgada por um leigo. Isto está francamente errado.
Argumentar contra uma teoria científica não pode ser feito porque não gostamos dela. Isso dá de facto origens a "teorias da conspiração", falácias variadas e acusações de fraude implausíveis e não a argumentos científicos que requerem muitas vezes ser-se um verdadeiro especialista da matéria. Se não sabemos argumentar consistentemente se calhar é porque não sabemos o suficiente para ter uma opinião tão forte... Digo eu.
Não penso que as pessoas devam ser levadas a aceitar acriticamente seja o que for, mesmo se tiver o rótulo de ciência. Mas penso que se deve afirmar que a verdadeira abertura de espírito é aceitar a realidade como ela é. Aceitar as evidências pela sua importância real e não pelo que elas representam para determinadas culturas. E discutir abertamente os problemas tentando não deixar as nossas convicções pessoais toldarem- nos o raciocínio.
Pode ser tentador acreditar num mundo em que temos poderes curativos tipo Reiki, ou que podemos por vértebras no sitio carregando com os dedos ou espetando agulhas. Ou até, que se pode largar CO2 à vontade - que isso do aquecimento antropogénico é mania dos ambientalistas. Mas estas coisas têm evidência científica forte de que estão erradas. E a discussão não pode ser reduzida a chavões típicos de quem não tem melhores argumentos, como "a ciência não explica tudo logo tal e tal deve ser verdade" ou "isso é verdade porque a minha intuição mo diz" ou até "isso não pode ser verdade, já viste o problema que era?". Tudo raciocínios falaciosos. A discussão deve ser guiada para saber qual é a melhor explicação possível. E essa é em regra a da ciência. Diria mesmo que quando a explicação científica não é a melhor é porque não há maneira de saber mais, e apesar de poder estar errada não há razão para escolher à sorte outra. Porque na maioria das vezes isso é a aposta errada.
Ter verdadeiramente a mente aberta é ser capaz de aceitar as evidências. Não é aceitar toda a casta de tretas excepto aquelas que não dizem o que nós queremos.
Via Neurologica, do Steven Novella,
o artigo referido é este:
http://www.informaworld.com/smpp/content~db=all?content=10.1080/13669877.2010.511246
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quarta-feira, 6 de outubro de 2010
Acupunctura é placebo, o que conta é a crença no tratamento.
Já foi publicado em Abril deste ano mas mais vale tarde do que nunca. Um estudo na "Arthritis Care & Research" que põe a acupunctura em contraste com a "sham" (falsa - agulhas espantalho, pontos à sorte) acupunctura, além de um grupo a que não se fez nada, conclui que a falsa e a verdadeira têm o mesmo efeito.
Isto é o padrão cientifico para dizer que um tratamento não funciona. Quer dizer que o efeito terapêutico deve ser atribuído a outras causas que não sejam o objecto de estudo. Neste caso, como ambas as acupuncturas tiveram o mesmo efeito, mas foram superiores a não fazer nada, concluímos inequivocamente que estamos perante o efeito placebo. Mas esse efeito, é um efeito da crença e não do medicamento. Está presente em qualquer medicamento a que se consiga ligar a confiança do paciente.
E numa abordagem muito interessante, neste estudo ainda se decidiu testar essa variável, tentando isola-la da seguinte forma: Dentro dos grupos sujeitos a acupunctura, separaram-se três subgrupos a quem foram dadas expectativas diferentes. Um a que não era dado uma grande confiança no tratamento, outro que era dada confiança ligeira e outro a que se dizia que se esperavam grandes melhoras. Os resultados foram os esperados. O grupo com as melhores expectativas e mais confiante relatou melhores resultados. E o segundo mais confiante em segundo lugar O que confirma que a variável em causa na acupunctura é o efeito placebo.
Este estudo tem uma dupla conclusão. Uma é de que a acupunctura isolada não é um tratamento real. É treta. A outra é de que devemos ter todo o cuidado em conseguir investir o paciente de confiança. Como eu sou alérgico à treta, proponho que não devamos mentir ao paciente. Nem para seu bem. Mas como o efeito do placebo pode estar associado também aos medicamentos que têm de facto eficácia por si só, e a meios comprovados cientificamente, eu penso que se deve ter atenção a coisas que tradicionalmente o meio médico negligência. Todo o aparato à volta conta.
Este estudo, a par com outros que se vão acumulando, mostra que os sistemas de saúde devem ter uma recepção cuidadosa dos pacientes e os médicos e enfermeiros preparados para fazer um certo "counching". Sem querer por a responsabilidade especificamente em cima de ninguém, atrevo-me a dizer que isto até podia revestir de uma nova importância à profissão dos enfermeiros. Uma que eles sempre tiveram, mas que agora tem justificação cientifica e podia ser cientificamente estudada. De modo a proporcionar serviços de saúde exemplares.
Para terminar queria acrescentar duas coisas:
Este estudo foi sobre a dor. Era uma área onde a acupunctura ainda tinha alguma credibilidade. Não se sabia porquê mas havia resultados. Agora com a técnica que permite fazer uma acupunctura a fingir, resultando na eliminação de variáveis inespecificas (placebos), podemos ver o que esta realmente a funcionar. Não é a acupunctura. É o pensamento positivo (e no caso de alguns acupunctores o Ben-u-ron, pelo sim, pelo não).
Outra é que neste teste foi usada electro-estimulação nervosa que se sabe ja há muito tempo reduzir a percepção da dor. Isto é, ligaram as agulhas à electricidade. Não devia ter sido confundido com acupunctura tradicional chinesa, embora isso aconteça com frequência, pois é um meio de aumentar a resposta terapêutica face a grupos em que não se faz nada e tem eficácia comprovada ja ha muito tempo. Neste estudo a acupunctura falsa recebeu intensidades menores de corrente (segundo o S. Novella, pois no abstract não diz nada!) e não houve diferença. Podiam no entanto ter evitado mais esta variavel no estudo. No entanto o estudo foi desenhado para estudar o papel do efeito placebo na acupunctura e isso acho que faz eficazmente uma vez que sabemos que a electro-estimulação não reduz qualquer tratamento que existisse na acupunctura mas sim pelo contrário.
Notas:
Via "Neurologica" do Steven Novella - http://theness.com/neurologicablog/?p=2233
Ligação para o abstract:
http://onlinelibrary.wiley.com/doi/10.1002/acr.20225/abstract
Isto é o padrão cientifico para dizer que um tratamento não funciona. Quer dizer que o efeito terapêutico deve ser atribuído a outras causas que não sejam o objecto de estudo. Neste caso, como ambas as acupuncturas tiveram o mesmo efeito, mas foram superiores a não fazer nada, concluímos inequivocamente que estamos perante o efeito placebo. Mas esse efeito, é um efeito da crença e não do medicamento. Está presente em qualquer medicamento a que se consiga ligar a confiança do paciente.
E numa abordagem muito interessante, neste estudo ainda se decidiu testar essa variável, tentando isola-la da seguinte forma: Dentro dos grupos sujeitos a acupunctura, separaram-se três subgrupos a quem foram dadas expectativas diferentes. Um a que não era dado uma grande confiança no tratamento, outro que era dada confiança ligeira e outro a que se dizia que se esperavam grandes melhoras. Os resultados foram os esperados. O grupo com as melhores expectativas e mais confiante relatou melhores resultados. E o segundo mais confiante em segundo lugar O que confirma que a variável em causa na acupunctura é o efeito placebo.
Este estudo tem uma dupla conclusão. Uma é de que a acupunctura isolada não é um tratamento real. É treta. A outra é de que devemos ter todo o cuidado em conseguir investir o paciente de confiança. Como eu sou alérgico à treta, proponho que não devamos mentir ao paciente. Nem para seu bem. Mas como o efeito do placebo pode estar associado também aos medicamentos que têm de facto eficácia por si só, e a meios comprovados cientificamente, eu penso que se deve ter atenção a coisas que tradicionalmente o meio médico negligência. Todo o aparato à volta conta.
Este estudo, a par com outros que se vão acumulando, mostra que os sistemas de saúde devem ter uma recepção cuidadosa dos pacientes e os médicos e enfermeiros preparados para fazer um certo "counching". Sem querer por a responsabilidade especificamente em cima de ninguém, atrevo-me a dizer que isto até podia revestir de uma nova importância à profissão dos enfermeiros. Uma que eles sempre tiveram, mas que agora tem justificação cientifica e podia ser cientificamente estudada. De modo a proporcionar serviços de saúde exemplares.
Para terminar queria acrescentar duas coisas:
Este estudo foi sobre a dor. Era uma área onde a acupunctura ainda tinha alguma credibilidade. Não se sabia porquê mas havia resultados. Agora com a técnica que permite fazer uma acupunctura a fingir, resultando na eliminação de variáveis inespecificas (placebos), podemos ver o que esta realmente a funcionar. Não é a acupunctura. É o pensamento positivo (e no caso de alguns acupunctores o Ben-u-ron, pelo sim, pelo não).
Outra é que neste teste foi usada electro-estimulação nervosa que se sabe ja há muito tempo reduzir a percepção da dor. Isto é, ligaram as agulhas à electricidade. Não devia ter sido confundido com acupunctura tradicional chinesa, embora isso aconteça com frequência, pois é um meio de aumentar a resposta terapêutica face a grupos em que não se faz nada e tem eficácia comprovada ja ha muito tempo. Neste estudo a acupunctura falsa recebeu intensidades menores de corrente (segundo o S. Novella, pois no abstract não diz nada!) e não houve diferença. Podiam no entanto ter evitado mais esta variavel no estudo. No entanto o estudo foi desenhado para estudar o papel do efeito placebo na acupunctura e isso acho que faz eficazmente uma vez que sabemos que a electro-estimulação não reduz qualquer tratamento que existisse na acupunctura mas sim pelo contrário.
Notas:
Via "Neurologica" do Steven Novella - http://theness.com/neurologicablog/?p=2233
Ligação para o abstract:
http://onlinelibrary.wiley.com/doi/10.1002/acr.20225/abstract
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domingo, 3 de outubro de 2010
Protectores de cartilagem são apenas placebos.
Por mais gliscosamina ou condroitina que nós tomemos isso não vai fortalecer/regenerar mais as nossas cartilagens.
Tal como esperado, um meta estudo recente mostra que a importância destes populares tratamentos não vale mais que o valor placebo associado. O estudo vem da medicina humana, mas a popularidade destas moléculas em medicina veterinária é igualmente elevada. E creio que as conclusões devem ser extensíveis. Não há assim tanta diferença no metabolismo entre nós e os cães.
Estas moléculas são os tijolos de construção do tecido cartilaginoso. Mas não é por dar mais que aquilo vai dar origem a tecidos cartilagineos funcionais. De facto a maioria das substancias essenciais que nós ingerimos tem uma valor máximo que é benéfico, e que a partir do qual não há vantagens. Isso é verdade por exemplo para minerais e vitaminas que continuam igualmente a ser "marketizadas" em cocktails para "aumentar as defesas", "fortalecer o sistema imunitário" , etc.
A regeneração dos tecidos é um processo complexo que requer mais (muito mais) que matéria prima para ser bem sucedido. A arquitectura normal dos tecidos não nasce de um excesso de matéria prima. Ingerir condroitina e glicosamino glicanos é um pouco como comer cérebros para se ficar mais inteligente.
Penso que a conclusão é clara. Para ja não faz sentido investir nestas moleculas para tratamentos quase sempre cronicos. Devemos evitar gastar dinheiro em inutilidades e aplica-lo onde faz mesmo diferença. Por muito inofensivas que sejam estas moléculas. Que são.
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