A acupunctura é uma prática antiga chinesa que alega conseguir manipular o Qi, através da inserção de agulhas finas em pontos predeterminados do corpo. O Qi, dizem os praticantes, é a energia vital do nosso corpo, cuja perturbação é a origem da doença. Só que tal energia é uma entidade extra, desnecessária à explicação dos fenómenos fisiológicos, (contrariando o princípio de Occam).
Pode-se dizer com alguma segurança que a bioquímica e a fisiologia são mesmo opostas ao conceito do Qi. Cada vez se conhece mais sobre o funcionamento do corpo, (até ao nível molecular) e os mapas metabólicos sugerem um funcionamento perfeitamente independente de tal forma de energia na nossa vida. Por outro lado a patologia científica acumula conhecimento que identifica de forma muito mais precisa os mecanismos da doença. Espetar agulhas finas em determinados pontos para resolver problemas de saúde não tem qualquer tipo de suporte racional nas teorias vigentes da biologia humana. Nem esses pontos de acupunctura têm alguma diferença histológica ou anatómica característica que indicie a sua existência.
Mas apesar da inconsistência com os avanços da ciência e da medicina, a acupunctura goza de uma extraordinária reputação no ocidente e também em Portugal. Na crista da onda das ditas medicinas complementares e alternativas, acarinhada por alguma imprensa, parece vir ao encontro de uma tendência mística recente.
Adicionalmente e provavelmente devido a algum enaltecimento dos resultados experimentais a nível da analgésica ligeira, um critério relativamente subjectivo, faz-se um uso indiscriminado do “provado cientificamente” aquando da sua discussão. É de facto uma alegação exagerada.
Para além dos mecanismos de funcionamento serem completamente inconsistentes com a ciência, cabia de qualquer modo à experimentação sistemática clínica ter a palavra final. Às vezes descobrem-se coisas por acaso, mesmo quando aparentemente não fazem sentido. Por isso, comparam-se os resultados de eficácia do tratamento em estudo com os de um grupo placebo. Expliquei como funcionavam os ensaios clínicos com algum detalhe no artigo “medicinas alternativas e as outras” (1), por isso adiante.
O problema está em que a acupunctura não mostra evidências de ser eficaz para o tratamento de doenças, porque tem dificuldade em separar-se do efeito placebo. É o que mostram os estudos mais recentes em que se tentou simular o acto da acupunctura com pressão exercida no local mas sem espetar a agulha (2). Chama-se “sham acupuncture” em Inglês a esta solução para o efeito placebo na acupunctura. E as evidências parecem apontar para a conclusão de que a “sham” é tão boa como a real.
Exemplos de estudos com resultados promissores também existem (3) mas dificilmente escapam a uma análise metodológica. Por exemplo, no caso referido acima, sobre dores de cabeça crónicas, o estudo não é fiável porque (entre outras razões) não é cego (os médicos e os pacientes sabem quem é o grupo que recebe tratamento e quem não recebe), e igualmente grave, nem sequer usa placebo. Mas para uma análise detalhada a este estudo, (e em que se pode aprender muito), referencio o artigo dos médicos Orac (4), ou Steve Novella (5).
No livro “truque ou tratamento”(6), em que é feita uma revisão sistemática de vários estudos, a conclusão é que a Acupunctura pode ser útil no alivio da náusea ou na dor moderada… Que são áreas por natureza amigas do efeito placebo. E como se mostrou recentemente, há placebos uns melhores que os outros (7). Talvez a acupunctura seja a rainha dos placebos.
Mas, seja como for, eficácia comprovada e consensual no meio cientifico em outros problemas é tão visível como o Yeti. Contra quem eu não tenho nada. Talvez até exista. Talvez também a acupunctura seja mais que um excelente placebo, resta provar exactamente em quê.
Abaixo encontram-se os links para as paginas citadas assim como quatro estudos (8) ,(9),(10) e (11) a ilustrar a variedade de situações em que a acupunctura foi estudada (devido a haver alegações de eficácia); como vantagens na fertilização in vitro, tratamento dos “hot flashes” em pacientes com cancro da mama, insonias... Em nenhum destes estudos se mostrou mais eficácia que o placebo.
Nesta revisão de 2009, encontraram-se efeitos moderados de analgesia mas não relevantes clinicamente (12)
Nesta revisão de 2010 a eficácia para a acupunctura fica apenas atribuída a dor cervical moderada e são encontrados vários efeitos adversos (13)
Ultimo Update Out 2011
(1) http://cronicadaciencia.blogspot.com/2008/10/medicinas-alternativas-e-as-outras-uma.html
(2.1)http://archinte.ama-assn.org/cgi/content/abstract/167/17/1892?maxtoshow=&HITS=10&hits=10&RESULTFORMAT=&fulltext=acupuncture&searchid=1&FIRSTINDEX=0&resourcetype=HWCIT
(3) http://www3.interscience.wiley.com/journal/118976474/abstract?CRETRY=1&SRETRY=0
(3) http://www3.interscience.wiley.com/journal/118976474/abstract?CRETRY=1&SRETRY=0
(4) http://scienceblogs.com/insolence/2008/08/the_largest_randomized_acupuncture_study.php
(5) http://www.theness.com/neurologicablog/?p=368
(6) http://www.amazon.co.uk/Trick-Treatment-Alternative-Medicine-Trial/dp/0593061292
(7) http://jama.ama-assn.org/cgi/content/full/299/9/1016
(8) http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/18652588?ordinalpos=2&itool=EntrezSystem2.PEntrez.Pubmed.Pubmed_ResultsPanel.Pubmed_DefaultReportPanel.Pubmed_RVDocSum
(9) http://www.clinicalpain.com/pt/re/clnjpain/abstract.00002508-200803000-00005.htm;jsessionid=JnHZ7JB7K4BfWJN2Jvmc2XcMBTpzQ0CS8kGmPfktkXXPJyRyTzCG!1727167508!181195629!8091!-1
(10) http://jco.ascopubs.org/cgi/content/abstract/25/35/5584
(5) http://www.theness.com/neurologicablog/?p=368
(6) http://www.amazon.co.uk/Trick-Treatment-Alternative-Medicine-Trial/dp/0593061292
(7) http://jama.ama-assn.org/cgi/content/full/299/9/1016
(8) http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/18652588?ordinalpos=2&itool=EntrezSystem2.PEntrez.Pubmed.Pubmed_ResultsPanel.Pubmed_DefaultReportPanel.Pubmed_RVDocSum
(9) http://www.clinicalpain.com/pt/re/clnjpain/abstract.00002508-200803000-00005.htm;jsessionid=JnHZ7JB7K4BfWJN2Jvmc2XcMBTpzQ0CS8kGmPfktkXXPJyRyTzCG!1727167508!181195629!8091!-1
(10) http://jco.ascopubs.org/cgi/content/abstract/25/35/5584
(11)http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/17636800?ordinalpos=1&itool=EntrezSystem2.PEntrez.Pubmed.Pubmed_ResultsPanel.Pubmed_DiscoveryPanel.Pubmed_Discovery_RA&linkpos=3&log$=relatedreviews&logdbfrom=pubmed
(12) http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC2769056/?tool=pmcentrez
(13) http://www.painjournalonline.com/article/S0304-3959(10)00689-5/abstract
(12) http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC2769056/?tool=pmcentrez
(13) http://www.painjournalonline.com/article/S0304-3959(10)00689-5/abstract
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