terça-feira, 29 de março de 2011

Bem vindo ao seu cérebro.

"Bem vindo ao seu cérebro" é a tradução literal do nome do livro vendido  em Portugal com o titulo "Cérebro - Manual do Utilizador".  Tinha sido muito mais correcto manter o sentido original do titulo, já que o livro ensina muito mais acerca do que é o cérebro do que o que devemos fazer com ele. É certo que sabendo como funciona podemos ter uma ideia melhor de como o usar, e o livro está cheio de pequenas notas práticas sobre o que melhora ou piora o funcionamento deste órgão. É um pormenor insignificante, mas apeteceu ser picuinhas já que  gosto muito mais do titulo original. E é menos pomposo. Adiante.

A simplicidade com que está escrito, por vezes com uma prosa infantil de livro de escola, esconde não só o trabalho enorme de bastidores que tem um livro com este conteúdo, como a pertinência e rigor cientifico do próprio conteúdo.  

Não carrega demasiado na forma como se chegou a esta ou aquela conclusão, não está quase referenciado em relação a quem descobriu o quê ou quem disse o quê. É um livro de divulgação cuja maior ambição me parecer ser o de poder ser lido por todos.

Aconselho a todos os que quiserem uma abordagem leve (enganadoramente leve) mas não inconsistente ou incorrecta do que se sabe actualmente sobre o mais complexo órgão do nosso corpo. E para tirar a teimas sobre uma data de mitos que por aí circulam.


Cérebro - Manual do Utilizador, pela Pergaminho
ISBN 9789727118571




segunda-feira, 28 de março de 2011

Simplicidade Revisitada.

Princípios de Simplicidade



A Lâmina de Occam, Elegância e Parcimónia



Um dos princípios mais unanimemente aceites em todo o processo do conhecimento humano parece ser o de que a simplicidade de uma explicação ou teoria é uma vantagem. Em vários aspectos, se não todos.



Desde filósofos a cientistas e até teólogos, todos ou quase todos, têm incluída na sua caixa de ferramentas a simplicidade. De facto, o seu primeiro enunciado é atribuído geralmente a Aristóteles e parece coincidir com os princípios do conhecimento em si mesmo (no mundo ocidental). A nossa filosofia nasce aí. Aristóteles disse:



“Quando todos os outros aspectos são idênticos, deve aceitar-se como superior a demonstração que deriva de menos hipóteses ou postulados”



Muito mais recentemente, Einstein dizia que “uma teoria deve ser tão simples quanto possível, mas não mais do que isso”.



Passando por Kant, Popper, Tomás de Aquino, Newton, Galileu, Lavoisier, são muitos os que têm defendido uma versão ou outra dos princípios de simplicidade no conhecimento. Têm sido princípios extremamente fecundos. A justificação de porque é que a simplicidade é uma virtude metodológica ou epistemológica é que é mais complicada. (E até mesmo se é uma virtude metodológica ou epistemológica ou ambas, mas isso está para além do âmbito deste texto.)



Embora os princípios de simplicidade estejam intrinsecamente relacionados e não sejam claramente distintos, a tentativa de os explicar obriga a que sejamos concretos (simples?) a dizer a que nos estamos a referir. E isso leva a criar definições. De acordo com os filósofos, logo numa primeira abordagem, temos de separar a simplicidade em dois princípios:



A simplicidade sintática ou elegância e a simplicidade ontológica ou parcimónia.



A simplicidade sintática diz respeito ao número e clareza das hipóteses que são necessários para a explicação.



E a simplicidade ontológica diz respeito ao número de novas entidades que temos de postular para explicar algo.



A Lâmina de Occam é vulgarmente considerada como referindo-se a simplicidade ontológica e é frequentemente enunciada assim: “As entidades não devem ser multiplicadas para além do necessário”.



Esta distinção é importante não só pelas tentativas de justificação serem diferentes, mas porque existe por vezes um compromisso entre um aspecto e outro da simplicidade. Digamos que ao acrescentar de um lado estamos a tirar do outro. E é preciso ver para que lado a balança pende.



Por exemplo: Dizer que o vento é o resultado de um ser mágico como a fada-do-vento, é uma explicação elegante. É sintaticamente simples. E é completa para o que se propõe. A vontade da fada explica o vento. Mas é uma explicação ontologicamente complexa, pois leva a ter de postular uma entidade extra para explicar o vento. Se tirarmos a fada da explicação, temos de nos socorrer de uma bateria enorme de outros conhecimentos para explicar porque há vento a soprar. É sintaticamente mais complexa. O equilíbrio da importância destes aspectos, qual é que valorizamos mais, também não é claro. Neste caso, a atribuição de intencionalidade a fenómenos naturais, o apelo ao sobrenatural, fez sentido como sendo a resposta mais simples, até muito recentemente, quando aspectos de uma explicação naturalista se tornaram evidentes.



O contexto em que se julga uma teoria é importante, obviamente. Aquilo que se sabe é importante. Para o que se sabia, digamos, há 6000 anos atrás, aquela resposta podia ser a mais elegante e a mais parcimoniosa possível – notar que os princípios não dizem que não podemos postular novas entidades, apenas que devemos evitar fazê-lo se para isso não comprometermos poder explanatório.



Para continuar com este exemplo e agora colocando-nos no contexto cientifico dos dias de hoje, este é um caso em que é fácil explicar a razão porque devemos preferir a simplicidade.



Como todos os mecanismos e entidades usados para explicar a deslocação de massas de ar à superfície da Terra estão eles próprios bem estabelecidos e provados, (assim como os passos intermédios), isto leva a uma situação “fácil” de justificar em que de um lado, temos a explicação científica, e do outro, a explicação científica mais a fada, em que a fada-do-vento aparece como uma entidade neutra, não interventiva – e portanto sem significado explanatório. Em suma, não faz sentido dizer que a fada lá está de qualquer maneira, apesar de ser igual a não estar para todos os efeitos. Vejamos:



A= explicação científica.



B= explicação científica + fada



A é melhor que B se ambas são iguais em tudo o resto. Porque assim, a fada não está lá a fazer nada. Acaba assim por tornar a teoria mais complicada do que aquilo que queremos explicar, e a isso chama-se complicar. E quem diz a fada, diz qualquer outra coisa que seja supérflua.



Podemos sempre adornar uma teoria com entidades a gosto se as fizermos neutras, mas se esse é o caso, porque o haveríamos de fazer? Não com a desculpa de estarmos a compreender ou a explicar melhor algo. Se a verdade é que essa entidade está de facto lá, sem fazer nada, é melhor dizer que então ela não pertence à explicação. Dizer que ela é neutra e passiva é também dizer que não há maneira de ter informação sobre ela. Se há maneira de saber, então vai haver mais tarde ou mais cedo uma diferença pratica entre os testes às duas teorias.



Mas casos tão claros como este não são a regra no meio da discussão científica e filosófica. As situações em que as teorias dizem exactamente o mesmo (ou fazem as mesmas previsões) são raras, e além disso é preciso pesar diferentes aspectos de como se mede a simplicidade e do que queremos com ela. A justificação de porque é que a teoria mais simples é a melhor, segundo Sober (1994) por exemplo, deve ser feita caso a caso – o que em última análise torna estes princípios inúteis, já que nos obrigaria sempre a ter outra justificação que não a simplicidade. O que a tornaria supérflua, pelas suas próprias indicações.



Haver outra justificação é de facto o que acontece a maior parte das vezes, mas a posteriori. Felizmente temos mais ferramentas. Que acabam precisamente por mostrar que a explicação mais simples era a maior parte das vezes, a melhor.



Os princípios de simplicidade são úteis desde a investigação policial ao diagnóstico médico. Apenas por vezes se torna difícil dizer qual a teoria mais simples:



Em que medida? Em termos ontológicos ou sintáticos, qual é mais importante? Em termos de quantidade, ou qualidade isto é, número versus variedade? E com que objectivos? Para decidir o ónus da prova, para saber que teoria tem mais probabilidade de estar certa ou para dizer qual permite um campo de investigação mais frutuoso? Ou para dizer qual está mais perto da verdade?



Podemos dizer que justificamos a simplicidade porque sabemos que funciona. Ou seja, usando a indução. Usamos como prova tudo o que se conseguiu explicar e prever recorrendo a estes princípios. Mas aqui caímos no problema de justificar a indução. E analogamente estamos a explicar a simplicidade com as coisas a que ela própria deu origem, o que é uma regressão infinita.



No entanto, se o universo se comportar sempre como até agora, (facto que se tivéssemos como certo seria uma justificação para a indução, pois a questão da causalidade estaria simplificada), não há grande perigo em depositar alguma confiança na simplicidade. Não há razão para acreditar que ela vá agora de repente deixar de funcionar. Pelo menos se além disso, o cérebro humano não perder a tendência natural que tem para complicar e que é compensada por esta crença na simplicidade.



Talvez estes princípios tenham de ser tomados mais correctamente como sendo pressupostos básicos para questionar quando soubermos o suficiente, mas não para já.



Esta crença é de tal modo difícil de justificar que Einstein dizia mesmo que era o que o cientista tinha de mais parecido com a fé religiosa. A crença na simplicidade.



A título de nota e para não prolongar este texto demasiado vou mencionar apenas o tipo das tentativas actuais de justificar a simplicidade:



De acordo com o princípio de simplicidade em causa:



1- Justificações a priori, metafisicas ou teológicas para a parcimónia e elegância

2- Justificações naturalistas e científicas para a parcimónia (simplicidade ontológica)

3- Justificações por estatística e probabilidades para a elegância.

Bibliografia: Entrada "simplicity" na Stanford Phylosophy Enciclopaedia on-line


domingo, 27 de março de 2011

Falsificacionismo. Demonstração gráfica.

Falsificacionismo.

Popper dizia que se não é falsificavel não é ciência. Porquer?

A preto são os dados reais que podem ser obtidos. A vermelho os previstos pela teoria.
Como me diverti bastante a fazer o outro post do "ensaio visual" acerca da completude e consistência  e como há muita gente que não compreende o porquê da necessidade do falsificacionismo, decidi explicar o dito cujo de um modo gráfico.

O que está na imagem acima não é um peixe maluco. A linha grossa a preto representa os dados que a natureza tem para dar acerca de determinado aspecto da sua existencia. Dados esses que nós ainda não conhecemos todos. Temos no entanto o modelo A, que foi feito com os dados conhecido até então, imaginemos por exemplo com os da parte mais final de todas da cauda (por isso puz o olho à frente, para que não haja duvidas do que estou a falar, a ciencia é mesmo assim). Os resultados que o modelo A devolve são toda a area a vermelho e que inclui uma grande parte da linha grossa preta - a que corresponde à realidade.

Conclusões:
Isto quer dizer que se não testarmos o que a teoria promete que vai acontecer, nunca vamos saber que ela está bastante errada - area vermelha à volta da linha preta.

Pois se apenas compararmos os dados experimentais (sem testar as previsões teorias, portanto a linha a preto) e tentarmos ver se encaixam na teoria, eles vão encaixar sempre. Mas a teoria está errada. Tem muitos falsos positivos. É demasiado vaga. E fazer teorias vagas é facil e não é cientifico.

Ao eliminar teorias com muitos falsos positivos estamos a fazer teorias mais especificas. Menos vagas. Que são realmente sobre o que estamos a tentar explicar.

Se a teoria prevê correctamente medições que de outro modo não eram esperadas, é porque temos uma boa razão para achar que conhecemos o comportamento da entidade que pretendemos conhecer. Se a teoria é capaz de prever o que acontece a seguir ( em todos os aspectos), é uma demonstração que sabemos algo acerca do como as coisas se processam. É uma maneira de ultrapassar alguns problemas relacionados com a indução como fonte de conhecimento.

É por isso que uma teoria explicar resultados conhecidos e acertar em resultados previstos são coisas diferentes. Um milagre é uma explicação que abrange tudo. Mas não faz previsões sobre observações expecificas, por isso não é cientifica. Na realidade não explica nada, é apenas passar de um mistério para outro. Mas depois de perceber o falcificacionismo isso fica mais fácil de perceber.

domingo, 20 de março de 2011

O que pensam os filósofos.

Crentes de variadas teorias e entidades imaginadas gostam de dizer que as suas entidades se provam filosoficamente.

A lei acercas das medicinas alternativas existe porque o Jorge Sampaio quando era Presidente da República decidiu que tínhamos de deixar a porta aberta a outras "filosofias" para explicar a doença.

Os crentes em deus falam em provas metafísicas e insistem que a ciência não pode testar deus, sem com isto perceberem que estão a dizer que deus não existe para todos os efeitos.

Os relativistas mais extremos - felizmente raros - insistem que tudo depende do observador e da sua filosofia, portanto afirmando que não haverá uma realidade extra cognitiva.

Por outro lado, sabendo que em qualquer actividade (desde a ciência à moral, à politica, etc)  há sempre uma minoria que defende franjas rídiculas de pensamento, é importante saber o que é mais provável que seja a melhor conclusão.

Ou seja, é importante conhecer os consensos para saber o que pensa a maioria dos experts de uma determinada área, pois de outro modo ficamos com uma data de teorias contraditórias defendidas por vezes por lunáticos. Não estando por dentro do grupo de especialistas, a nossa melhor aposta é tentar saber o que a maioria pensa.


Então o que pensam os filósofos? Na maioria das coisas estão em desacordo - tal como eles próprios já tinham previsto. O que revela que há coisas que ainda não sabemos minimamente sequer como abordar.

Mas há outras que são consensuais.

Que a realidade existe. Que deus não existe. Por exemplo.

Mesmo o Naturalismo tem 49% de "votos a favor". Contra 25% de Não-naturalismo ou 25% de Outro.

O Relativismo só é defendido por 2,9%.

Por isso, definitivamente dizer que a filosofia serve para provar tudo o que passa pela cabeça de alguém é treta. Isso é filosofia de franjas. É escolher as cerejas. É má argumentação. É uma falácia de apelo à autoridade, já que pretende em inúmeros casos valer por si só.

A maioria dos filósofos reconhece que há coisas que são treta. E que há coisas para as quais não temos resposta. Mas o que não se sabe não prova nada.

Ver mais aqui:

(notícia)  http://www.gmilburn.ca/2009/12/11/reality-morality-controversy-and-consensus-in-philosophy/

E aqui a página do estudo:

http://philpapers.org/surveys/results.pl

Via Facebook, Pedro Amaral Couto.

quarta-feira, 16 de março de 2011

Ser apenas placebo é pouco. Muito pouco.

O efeito placebo é mais um efeito de percepção do que fisiólogico.

É um efeito da crença e não do tratamento.


É para aí que as evidências apontam cada vez com mais certeza.

Abaixo segue a ligação para uma Cochrane review que conclui não haver efeitos clinicos significativos atribuiveis ao placebo.

http://onlinelibrary.wiley.com/o/cochrane/clsysrev/articles/CD003974/frame.html

A ler. No fim tem uma versão para leigos, se bem que em lingua inglesa.

domingo, 13 de março de 2011

A ciência e a Natureza.

Há quem diga que a ciência, ao reduzir o estudo de algo às suas partes significantes mais simples, está a tirar-lhe a beleza. Mas não é verdade. O meu interesse pela ciência está muito ligado ao meu gosto pela natureza, pela beleza que o meu cérebro encontra desde as coisas mais simples às mais complexas deste universo e de como saber mais sobre elas acaba por fortalecer ainda mais esse gosto.


É verdade que a beleza está na mente, não está nas coisas. Somos nós que a vemos lá. Mas isso não é um problema. Enquanto nós formos nós. Enquanto sentirmos.

Não deixamos de sentir como sentimos só por compreender como isso se processa nos nosso corpo. Nem de admirar a beleza de um pôr-do-sol só por sabermos que essa beleza é uma propriedade atribuída por nós.

Não é preciso também postular espiritualidades misteriosas e misticismos bizarros para usufruir destas características humanas. Nós, humanos, em regra, gostamos da natureza. Gostamos dos amigos, da família, da terra onde crescemos e essas coisas dos poemas.

Temos é maneiras diferentes de explicar as coisas. Uns acham que tem de haver uma alma para que isso faça sentido. Outros acham que a alma é uma ilusão e que a consciência é tudo o que há. Naturalmente que eu pertenço ao ultimo grupo, mas argumentar que esta é a melhor explicação não é o âmbito deste posta.

Apenas dizer que ao compreender não só não se  destrói o que se compreende mas aprende-se a apreciar ainda mais. O que já estava antes não se perde.

Apenas ficamos com  mais pormenores para apreciar.

Por isso tenho vindo a colocar aqui algumas das minhas fotografias da natureza. Todas as que estiverem sobre o rotulo "fotos natureza" foram feitas por mim e acredito que revelam, no mínimo, o gosto que tenho pelo ambiente natural que nos envolve. Desde pormenores, a cenários abertos. A bichos, a plantas. O meu apreço pelo mundo é indissociável da vontade de o conhecer.

Espero que agrade também a quem veja. Há coisas que sabem melhor se forem partilhadas.

 As duas de cima são na Serra da Estrela. A cá de baixo é perto do guincho. Verão vs Inverno! :P

sábado, 12 de março de 2011