segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

Lógica paraconsistente e lógica de valores multiplos.

No lógica clássica, as contradições não são toleráveis. Se algo pode ser verdadeiro e falso ao mesmo tempo num determinado sistema, então vale tudo. Os sistemas passam a precisar de ter os seus teoremas como axiomas (algo que se assume à partida que é verdadeiro, em vez de ter de ser provado)  e tornam-se sistemas triviais. Os lógicos chamam a isto, o principio da explosão.

No entanto, a necessidade de encontrar um sistema lógico que fosse capaz de lidar com contradições, nem que fosse pelo facto de diariamente nos esbarrarmos com elas, levou à procura de uma lógica que fosse capaz de lidar com contradições, sem explodir, e de uma maneira discriminatória (que não as ignore pura e simplesmente).

E então, no inicio do século passado surgiu a lógica paraconsistente, que em troca desta virtude, perde a extensão proposicional que existe na lógica clássica. Não é por isso uma extensão viável da lógica clássica.

Por exemplo, é preciso excluir pelo menos um destes 3 princípios, extremamente simples, claros, intuitivos, lógicos...


Introdução da disjunção: Isto é, podemos introduzir disjunções, "ou"s, em provas. Por exemplo, se o "peixe vive no mar" é verdade, também "o peixe vive no mar ou na terra" é verdade  -  se P é verdadeiro também P ou Q é verdadeiro.
Silogismo disjuntivo:  Ou seja, por exemplo em linguagem natural: "Ou os patos amamentam ou os patos são aves". "Os patos não amamentam os seus descendentes", logo "os patos são aves".  -  P ou Q. Não P, logo Q.
Transitividade: Por exemplo em relação ao tamanho: Se A maior que B e B maior que C, então A maior que C.

Normalmente a sorte cai ao silogismo disjuntivo, e de facto se A e nãoA podem ser verdadeiros ao mesmo tempo, então o principio não faz sentido. Argumenta-se que para os programadores de software esta possa não ser a melhor abordagem e sim desistir da introdução da disjunção, porque lhes permitiria continuar com uma série de outras propriedades que eles precisam. Muitas vezes corta-se com ambos.

Existem outras séries de princípios entre os quais temos de fazer cortes, mas para simplificar, como exemplo do que são esses cortes, isto chega. Também serve para ilustrar que lógicas paraconsistentes há muitas e que andamos a fazer experiências para ver o que as coisas dão.

Como é fácil de prever, a lógica paraconsistente tem os seus críticos, embora não deixe de ter as suas utilidades (e alguns sistemas paraconsistentes são muito extensivos, permitindo uma série de inferências comuns).

Concordo com duas criticas: 1 - é muito mais intuitivo e aparentemente, lógico, aceitar o principio da explosão - volta e meia defendo esse mesmo principio contra aqueles que querem que aceitemos contradições - que assim vale tudo.  2 - a negação não pode ter o mesmo significado que tem na lógica convencional. Se aceitamos A e nãoA como verdadeiro, o não tem de ser apenas um operador mais fraco.

Se a negação tiver o mesmo significado que em lógica clássica, em boa verdade  me parece a mim que ou a lógica clássica é lógica, ou a paraconsistente é, mas não as duas. Ou seja, um meta-sistema lógico que abranja as duas tem de ser paraconsistente. Mas para ser paraconsistente não pode aceitar certos princípios da clássica. Adiante:

Há alternativas que sirvam para lidar com os mesmos problemas, nomeadamente de dados contraditórios do mundo empírico e a incerteza? Sim. Lógica de múltiplos valores e inferência bayesiana, lógica intuitiva, teoria de Dempster-Shafter, etc.

A inferencia bayesiana é um metodo de inferencia que usa regras que servem para atribuir probabilidades a uma hipotese (um pecado na estatistica clássica) e fornece um quadro de trabalho matemático onde esse valor é actualizado conforme aumenta a evidencia empirica. É muito importante em ciência.

As lógicas de valores multiplos, são lógicas que não contam apenas com verdadeiro e falso (lógica bivalente). A primeira da lista é a lógica trivalente (verdadeiro, falso e desconhecido). Depois a lógica tetravalente e por aí fora até à lógica  fuzzy (por exemplo muito usada em inteligência artificial) com infinitos valores  entre verdadeiro e falso, e lógica probabilistica.

A lógica de múltiplos valores tem imensas variações e interpretações. Está para além do intento deste "post" entrar nessa área a fundo (até porque tenho muito para estudar sobre isso).

Apenas quero mencionar que serve para exprimir incerteza, e que a  lógica de valores contínuos fuzzy não se deve confundir com logica de probabilidade mas que são matemátivamente similares. É a diferença entre falar de probabilidade de uma coisa acontecer ou do quanto próximo da verdade estará uma afirmação - na lógica fuzzy lidamos com graus de verdade, não probabilidades. Também vale a pena notar que existe extenso debate e criticas sobre estes tipos de lógica.

A verdade mantém-se sempre, no entanto, como algo que é propriedade dos conceitos e não da realidade. Ou seja, a verdade é sobre o conhecimento, não sobre o que as coisas são em  si (as coisas seriam sempre verdade nesse caso, e caso fossem mesmo coisas).

Em resumo, a lógica clássica  é mais bonitinha, mas lida mal com as contradições e incertezas da investigação empirica. E por isso precisamos de umas lógicas um pouco mais "ad-hoc", para casos bicudos.

Curiosamente, os nossos neuronios funcionam com algo mais parecido com lógica fuzzi. Eles aumentam ou diminuem a frequencia de despolarização para enviarem um sinal, embora por vezes só haja duas interpretações possiveis para essas variações.

Bibliografia:

 Vários artigos da wikipédia que fui lendo, andando para trás e para a frente e só sei por onde comecei - Paraconsistent lógic.

Good Math, Bad Math

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