segunda-feira, 7 de setembro de 2009

Sobre o Tempo

Penso que uma das questões mais dificeis,  de toda a ciência e da filosofia, é a resposta à questão:

O que é o tempo? 

A enciclopédia Britannica (*) diz assim:

"Tempo:

Periodo medido ou que se pode medir.

Mais vagamente, é um continuum a que faltam dimensões espaciais.

Os filósofos têm procurado uma compreensão do tempo, focando-se em grandes questões, como a relação entre o tempo e o mundo fisico e a relação entre o tempo e a consciência. Aqueles que adotam uma teoria absolutista do tempo, olham-no como um tipo de contentor dentro do qual o universo existe e a mudança tem lugar e acreditam que a sua existência e propriedades são independentes do universo físico. Para a teoria rival, relacionista,  o tempo não é nada sobre e acima da mudança do mundo físico. Sobretudo por causa de Einstein, o tempo é agora tido como sendo algo que não pode ser separado do espaço. (espaço-tempo). Alguns argumentam que a teoria da relatividade suporta os absolutistas outros argumentam que suporta o relacionistas."

De facto a explicação do que é o tempo, (pela ciência) é nos dada fundamentalmente pela teoria da relatividade (1). Segundo ela, o tempo é parte de algo maior que é o espaço-tempo. Não existe separadamente. De tal modo, que nós nos estamos sempre a mover no  espaço-tempo, e o que tiramos do movimento num vai ser acrescentado ao movimento no outro. Confuso?

Se eu me começo a deslocar no espaço a 20 km/hora, essa velocidade vai ser descontada na velocidade com que eu me desloco no tempo. Se eu acelerar algo até à velocidade máxima possivel, a velocidade da luz, só vai sobrar movimento no espaço. Por isso, a luz não tem uma componente da deslocação no espaço-tempo que seja só no tempo. "A luz não envelhece".

Por outro lado, se eu estiver rigorosamente parado, só me estou a mover no tempo. Por isso, a sincronicidade, ou a percepção de que fenómenos ocorreram ao mesmo tempo, não é a mesma para quem se desloque a velocidades diferentes. Porque ao tratar do tempo e do espaço separadamente, eles são relativos. O absoluto é a entidade espaço-tempo. Não dá para separar, se o tentarmos passamos então a falar de um em relação ao outro.

Um problema que nasce da descrição da relatividade para o espaço-tempo, é que não dá nenhuma explicação acerca de porque é que andamos num sentido e não no outro.  E além disso, ao acabar com a noção de tempo absoluto, mostrando que observadores diferentes não concordam com que acontecimentos ocorreram ao mesmo tempo, destroi uma noção intuitiva que tinhamos de um tempo universal a fluir. O espaço-tempo pode ser descrito visualmente como se se tratasse de um longo solido, imagine-se um pão de cacete, com os acontecimentos a evoluirem continuamente ao longo do seu comprimento. Uma fatia desse continuum representa um momento para um observador. A passagem de um momento para o outro, aparentemente, é algo que a nossa consciencia faz. Deixando momentos do passado para trás. Isso é a nossa percepção...

...Mas a questão é que é possivel fazer fatias desse longo cacete tão obliquas que destruirão qualquer noção intuitiva de passado e futuro. Se as fatias forem feitas com velocidades como as que estamos habituados a lidar no dia a dia, elas vão sair direitinhas e paralelas a um eixo maior do cacete. Mas a velocidades relativistas, uma fatia pode ser tão obliqua que para determinadas distancias um acontecimento de uma ponta do cacete fique na mesma fatia que um acontecimento na outra ponta do cacete. Ou quase. Isto quer dizer que, dependendo do observador, acontecimentos no passado para umas pessoas, estão no futuro para outras. Acontecimentos que para uns são sincronos, estão na mesma fatia do bloco espaço-tempo, para outros são tão distantes como milhares de anos. Esta constantação ataca fortemente a ideia de um tempo absoluto a fluir pelo universo.

E se o tempo é algo que realmente flui, se existe uma seta do tempo (2) com uma direção, não é uma coisa obvia. As leis da fisica são simétricas para o tempo. São as mesmas para um lado ou para o outro do cacete de pão metafórico. Einstein diria mesmo que "os fisicos convictos como ele, sabem que o fluir do tempo é uma ilusão"

E a simetria das leis da fisica é uma propriedade considerada cada vez mais importante. Então, para além da nossa experiencia do tempo que evidencias cientificas temos que o tempo é algo que tem um sentido? E que as coisas acontecem nesse sentido. Ha uma seta do tempo ou não?

A unica resposta que encontrei a esta questão foi a da entropia. Como escrevi no post sobre a seta do tempo, a entropia é a unica lei cientifica assimetrica. Se o tempo flui, ele flui no sentido de aumentar a entropia.

Penso que depois do que escrevi posso acabar citando o resto do artigo da Britanica sobre o tempo:

"A primeira preocupação com a relação do tempo com a consciencia é a extensão com que o tempo ou aspectos do tempo dependem da existencia de seres conscientes. Acontecimentos no tempo são normalmente pensados como noções de passado presente e futuro, e alguns filósofos tratam-nos como sendo dependentes da mente; outros acreditam que o tempo é independente da percepção e defendem que passado presente e futuro são medidas objectivas do mundo."

Ou será a própria consciência uma propriedade emergente da nossa deslocação através do espaço-tempo? Ao invés de imaginar o tempo como consequência da nossa consciencia? ( como diz na E. Britannica - mas no fundo sendo a mesma coisa com uma causalidade invertida). Não faço ideia.

Notas e ligações:


(*)"time."Encyclopædia Britannica from Encyclopædia Britannica 2006 CD. .[Accessed September 7, 2009].

(1) Teoria da relatividade (partes I,II e III):

I - http://cronicadaciencia.blogspot.com/2009/08/sobre-teoria-da-relatividade-parte-i.html

II - http://cronicadaciencia.blogspot.com/2009/08/sobre-teoria-da-relatividade-ii.html

II - http://cronicadaciencia.blogspot.com/2009/08/sobre-teoria-da-relatividade-parte-iii.html

(2) Seta do tempo e entropia: 

http://cronicadaciencia.blogspot.com/2009/08/seta-do-tempo-e-entropia.html


Noutro blogue:

http://duvida-metodica.blogspot.com/2009/09/o-novo-ano-lectivo-e-o-tempo.html




6 comentários:

Pedro Amaral Couto disse...

Existem muitas palavras difíceis de definir e não o fazemos directamente. A palavra "percepção" é usada três vezes no artigo - a percepção é o que nos permite ter uma noção intuitiva de tempo: eventos ocorrem antes, depois ou ao mesmo tempo que outros. E essas comparações que fazemos podem não ser iguais às de outros observadores. E para o doutor Manhattan?

Já ouvi falar do modelo do cacete ou da bolha, mas nunca percebi o que representam os pontos das superfícies das secções elípticas (quanto mais perto das extremidades, mais pequenas são). Será que representa uma expansão como a do espaço?

Pedro Amaral Couto disse...

Existem muitas palavras difíceis de definir e não o fazemos directamente. A palavra "percepção" é usada três vezes no artigo - a percepção é o que nos permite ter uma noção intuitiva de tempo: eventos ocorrem antes, depois ou ao mesmo tempo que outros. E essas comparações que fazemos podem não ser iguais às de outros observadores. E para o doutor Manhattan?

Já ouvi falar do modelo do cacete ou da bolha, mas nunca percebi o que representam os pontos das superfícies das secções elípticas (quanto mais perto das extremidades, mais pequenas são). Será que representa uma expansão como a do espaço?

João disse...

Pedro

Aponta-me um boneco desses, para ver se percebi.

Mas o cacete é o espaço tempo.

uma secção eliptica, curva, representará o facto de o observador estar em aceleração.

Os pontos não sei se não serão algo apenas convencionado para usar como referencia.

João disse...

Por exemplo, os fisicos gostam muito de usar a analogia do balão a encher em que cada e qualquer ponto na superficie do balao se afasta de todos os outros enquanto o balao enche. Porque isto é o que se passou com o espaço tempo. Ele não aumentou no sentido em que houve um ponto central de onde diverge tudo. A inflação do espaço-tempo segundo os fisico não é igual a um aumento de volume como uma explosão onde existe um ponto de onde tudo vem.

Pedro Amaral Couto disse...

«Aponta-me um boneco desses»
O doutor Manhattan é um personagem da BD WatchMen, baseado na Mecânica Quântica, capaz de estar em vários lugares ao mesmo tempo (exemplo), de conhecer o passado e futuro e manipular a matéria à distância comparado com Deus ou SuperHomem e cujo pai era um relojoeiro que desistiu do seu emprego depois de conhecer a Teoria da Relatividade. A BD analisa a perspectiva que ele tem do tempo, que mais ninguém compreende.

«Mas o cacete é o espaço tempo.»
Sim, tens razão. Tinha-me lembrado de uma imagem dada por Hawking e confundi com o tempo, mas a bolha representa também o tempo-espaço.

Nesse caso, quanto maior a secção do cacete, mais dilatado é o espaço. Cada ponto na secção é um evento. Ao ser obliqua, é como se observássemos parte dos eventos do passado e outra parte do futuro (observa-se os eventos X e Y como se acontecessem ao mesmo tempo), comparando com uma secção não obliqua que a atravessa ao meio (observa-se os eventos X e Y como se acontecem em dois tempos diferentes). Cada secção é como uma imagem de um filme e o cacete é o filme todo.

João disse...

O tempo quantico é de facto outra história.

Não falei sobre isso.

Ainda é mais complicado. Leva a uma teoria das multiplas historias. Mas no passado a historia que fica é aquela que parece que sempre esteve determinada a ficar.

A não localidade é outra coisa . mas é uma propriedade quantica.

Nada disto são problemas para o mundo macroscopico. O Dr Manhatan usa a mecanica quantica para coisas do mundo grande. É um pouco como as teorias do Deepak Chopra.