Para alguns isto pode não parecer noticia de ultima hora, mas deparei-me recentemente com o argumento de que não vale a pena evitar comer carne de animal (e assim reduzir o sofrimento associados com o abate) porque teríamos de comer vegetais e as plantas também sofrem. Foi me dito inclusivamente que isso estava cientificamente provado e mandaram-me ligações de jornais com essa noticia.
Não, não está cientificamente provado. E as plantas não sofrem. Mesmo se considerarmos (como faz este autor) que o fototropismo é "ver", que quimiotaxia é "cheirar" e por aí fora. Não há no organismo vegetal uma estrutura complexa o suficiente para produzir um mapa do estado desse mesmo organismo. E sem essa estrutura não há sentimento de emoções. Até pode haver emoções se as definirmos como respostas organicas (quase como faz Damásio), mas não as sentimos (notar que as emoções de Damasio não são reaçoes organicas são respostas organicas em que o cérebro é um dos participantes)... Talvez se andarmos às voltas com o significado da palavra "sofrer" possamos encontrar uma construção do conceito em que faça sentido dizer que as plantas sofrem. Mas se o fizermos, esse sofrimento nunca será como o gerado por um sistema nervoso rápido, centralizado, e complexo ao ponto de ser capaz de se mapear a si próprio. Na melhor das hipoteses, se a planta sofre não sabe que sofre. E certamente que não pensa sobre o seu estado. A haver um sofrimento, ele será mais consequencia da nossa definição que do verdadeiro sofrimento da planta. Porque ela nunca vai saber disso.
Existe o argumento de que existe processamento de informação e comunicação entre as células vegetais. E que não sabemos o que é a inteligencia, a consciencia ou o sentimento. Logo não sabemos se as plantas têm inteligencia, consciencia e sentimento. Mas a verdade é que temos de usar o que sabemos para compreeder o universo (e não o que não sabemos) e é possivel justificar umas afirmações melhor que outras. E sabemos algumas coisa acerca da inteligência, da consciência ou do sofrimento. E não parece haver o suficiente de processamento na planta que dê para o gasto necessário ao processamento de emoções. Nem faz sentido que houvesse.
Existem comunicações entre células e texistem todas estas respostas complexas ao ambiente, certo. Mas compreendemos razoavelmente bem como elas se processam e são de facto a razão porque podemos dizer com certeza que as plantas estão vivas mas ainda assim, que sentir algo como sofrimento é uma evolução sobre o processo homeostático puro e duro que não é nada plausível que exista.
Até podemos dizer que sabemos isso porque sabemos o que é sofrer. E sabemos que isso requer mais que o processo homeostático em si, ou mesmo apenas da existencia de um sistema nervoso básico. A dor pode ter causa no corpo, mas é sentida no cerebro. E sob anestesia as coisas não doem. A anestesia não funciona ao nível da formação de sinalizadores da dor, como os analgésicos, mas sim no cérebro, que é precisamente onde nós sentimos a dor - e assim não sentimos.
Evolutivamente também não faz muito sentido esperar que as plantas sofram. Não há assim tanto que elas possam fazer para evitar o sofrimento. Não faz sentido a planta ser capaz de fazer grandes planos para evitar o sofrimento se não é capaz de os por em prática. Por isso não faz sentido existir algo como o sofrimento. A dor para a planta não deverá ser mais que uma simples reação de inibição e deslocação de recursos, tipo crescer de um lado e não de outro, ou eventualmente produzir frutos mais venenosos. Não faz sentido que seja um sentimento de dor.
Resumindo, num animal existe um processamento centralizado da dor a que se pode dar o nome de sentimento. Sentimos a dor. Ela é sinalizada a uma unidade de processamento central, o cerebro, que a coloca num mapa que inclui o corpo, o próprio cerebro e o meio exterior. Sem isso não ha sentimento de dor. E falar em dor que não se sente não é algo que faça muito sentido.
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