sexta-feira, 10 de outubro de 2008

Candidatus Desulforudis audaxviator

A vida tem uma capacidade adaptativa que não para de surpreender. Vem-me à memoria a frase do Jurassic Park de Michael Crichton, acerca do facto de só haver fêmeas, “Life will find a way (to reproduce)” ou seja “a vida há de encontrar uma solução (para se reproduzir)”. Depois de encontrar vida a temperaturas elevadíssimas junto a fontes termais subaquáticas, parecia que não faltava descobrir mais nada que ainda pudesse surpreender. Mas eis que numa mina de ouro da África do sul, a quase 3000metros de profundidade, sem luz, sem oxigénio, sem matéria orgânica de qualquer espécie e numa agua que não vê a superfície há milhões de anos se encontra um ecossistema de um único ser vivo.
A bactéria D. Audaxviator vive do urânio radioactivo presente, usa amónia dissolvida a partir das rochas e é capaz de a produzir se for preciso a partir de azoto inorgânico, é capaz de esporular para se proteger da adversidade e não usa oxigénio. Nem luz solar.
O genoma da bactéria foi analisado e muitas funções foram caracterizadas através do conhecimento que se ganhou através do estudo de outros genomas. Por se ter descoberto a função de muitos genes anteriormente pode-se muito mais rapidamente conhecer uma serie de funções da D. Audaxviator.
A D. Audaxviator responde assim afirmativamente a questões sobre se a vida seria possível em sítios sem Sol e sem qualquer espécie de alimento de origem orgânica. Isto torna mais plausível encontrar vida em Marte ou noutros planetas. Pelo menos é o que acham os Astrobiologistas.
O que eu penso é que para aparecerem este tipo de organismos, tem de haver já uma biblioteca de DNA ou RNA vasta e cheia de recursos, para depois com “apenas” alguns “acrescentos” se conseguir uma D. Audaxviator. O que ela não é, em toda a sua singularidade, é um membro isolado na árvore taxonómica da vida. É uma bactéria, tem RNA, vive em meio aquático e partilha genes com outros micróbios, inclusive do grupo archae. Aparentemente, e de acordo com o que sabemos, uma vez que ainda não foi encontrada vida noutros planetas, é que talvez a vida precise de condições mesmo muito especiais para surgir, mas uma vez que isso aconteça, a sua capacidade invasiva é elevada. Acredita-se que toda a vida existente sobre a Terra provem da mesma primeira entidade viva. Esta bactéria não representa nesse aspecto uma excepção.
A minha questão é: se a vida na Terra prova ser tão adaptativa aos mais incríveis ambientes, e aparece em quase todo o lado, porque não é tão fácil encontra-la ou pelo menos ter sinais dela noutros planetas? Eu acredito na possibilidade quase certa de haver mais vida algures no universo e em doses galopantes como aqui. Mas a cada descoberta nova da omnipresença da vida no nosso planeta me faz suspeitar mais da existência de vida em lugares onde não se vê o mínimo indicio. Eu sei que é preciso mais investigação e uma série de hipóteses para explicar este facto são possíveis, mas conclusões de que esta bactéria suporte a existencia de vida extraterrestre parecem-me especulativas. Repito, diz muito acerca da capacidade adaptativa, mas nada acerca das condições de origem.
Já agora, onde vamos descobrir a próxima? A viver na lava?

1 comentário:

José Lourenço disse...

É precisamente devido à descoberta destas formas de vida "extremófilas" - exaustivamente exploradas no livro da Ilda Dias que referenciei no outro post - que temos de repensar o nosso conceito do que é a vida e a forma como poderá ter surgido!

Saudações